4 livros sobre mulheres que mudaram o seu tempo
Biografias revelam personagens que foram contra as limitações sociais de gênero e transformaram o mundo a sua volta
06/03/2021
Zilda Arns: biografia conta como ela coordenou a vida pessoal e familiar com projeto que assistiu milhares de crianças no Brasil | Foto: Arquivo/CRM-PR
Como em tantas outras estatísticas, biografias de grandes mulheres são coleções minoritárias em editoras, livrarias e na maioria das estantes.
Mesmo menos numerosas, essas edições carregam histórias de alcance muito maior do que a vida pessoal dessas personagens que, ocupadas com a luta por suas convicções, não tiveram tempo de calcular o impacto que causariam em seu mundo e para o futuro.
Em comum, as mulheres que dão título a esses livros usaram empatia, determinação e muita teimosia no combate de males como a doença, a ignorância, a miséria e, como a data não deixa esquecer, o preconceito.
Março é mês em que a luta diária da mulher por respeito e garantia de direitos é lembrada. Seguem sugestões de histórias de profissionais, empreendedoras, cidadãs, mães, esposas e filhas que, de suas posições minoritárias, tornaram o mundo um lugar melhor e menos desigual.
Zilda Arns
A paranaense formou-se em medicina à revelia do pai. Uma das únicas de sua turma, deixou a faculdade para cuidar de crianças numa escala difícil de imaginar para qualquer profissional de saúde: quando morreu, em 2010, a fundação criada por ela três décadas antes assistia mais de 2 milhões de crianças e quase 100 mil gestantes.
A história da Pastoral da Criança, projeto pelo qual a médica entrou sem licença em gabinete de mais de um presidente do Brasil, é uma das passagens do livro de Ernesto Rodrigues, “Zilda Arns: Uma Biografia” (2018, editora Rocco), que também tece com cuidado histórico o cenário político do Brasil dos anos 1980 em diante.
Mas a biografia também se dedica a mostrar os conflitos entre a luta e a vida pessoal da pediatra de sorriso inabalável, que viveu a perda de dois filhos, o preconceito dentro da igreja católica (da qual era devota) e muitas portas na cara para por em pé o programa que salvou da miséria e da fome milhares de crianças brasileiras em uma fase que a mortalidade infantil do País quebrava anualmente recordes mundiais.
Marie Curie
Marie Curie foi a primeira mulher a vencer um prêmio Nobel, a primeira pessoa a receber dois em duas áreas diferentes. Ela descobriu o Rádio e o Polônio. Por seu trabalho, a medicina conta hoje com a radiografia e a radioterapia. Por isso são incontáveis o número de biografias escritas sobre a cientista polonesa.
Mas “Marie Curie, Imagens de Outra Face” (2012, Editora Livraria da Física), de Raquel Gonçalves-Maia, é o mais elogiado pelas sociedades científicas, por trazer as contradições e dilemas dos pesquisadores da vida real, sem ofuscá-los pelo heroísmo inerente a desbravadores como Curie.
O texto dá atenção a Marie Sklodowska, filha pobre de professores de antes do casamento com o também cientista Pierre Curie, parceiro de pesquisa com quem dividiu a descoberta da radioatividade a partir de sais de Urânio.
O livro recua até os anos do trabalho como governanta para custear os estudos da irmã e a insistência em frequentar escolas em um período em que as meninas eram proibidas de estudar na Polônia.
E chega claro, às láureas e passagens heroicas, como quando, durante a Primeira Grande Guerra, madame Curie inventou a radiografia móvel e saiu ela mesma pilotanto um dos veículos atrás de soldados feridos.
Katharine Graham
Antes de morrer, Eugene Meyer, pai de Katharine Graham, disse que não passaria o Washington Post para ela, “pois nenhum homem deveria ser colocado na situação de trabalhar para sua própria mulher”.
Ela teve de assumir o diário quando seu marido, nomeado pelo sogro à chefia, se suicidou.
Da repórter com pouca experiência à executiva que enfrentou a Casa Branca para publicar a série de reportagens que levou à renúncia o presidente Richard Nixon, o Watergate, a vida da mulher que colocou o “Post” na lista das maiores companhias dos Estados Unidos só poderia ter sido contada por ela mesma.
Bem-humorado, o livro ultrapassa os interessantíssimos bastidores da apuração e escândalo que derrubou Nixon. Graham fala com graça e humor da insegurança ao assumir os postos de chefia e toda a vida social e política que isso a obrigou.
“Uma História Pessoal” (1998, DBA) valeu um prêmio Pulitzer à executiva, aos 80 anos, pouco antes de morrer em decorrência de uma queda, quando voltava a pé de uma conferência de negócios.
Rosa Parks
Ainda aguarda a versão em português o livro mais respeitado sobre a mulher que mudou os direitos civis dos negros nos Estados Unidos. Escrito pelo historiador Douglas Brinkley, também biógrafo de Richard Nixon e John F. Kennedy, “Rosa Parks: A Life” (2005, Penguin) foi além da pesquisa.
Birkley não se contentou em recontar a conhecida saga da trabalhadora que se recusou a ceder o assento do banco em que estava sentada para um homem branco, infringido a lei segregacionista que ajudou a derrubar com o gesto.
Brinkley colheu depoimentos da própria ativista do Alabama, em falas que esclarecem pormenores que as versões para crianças e adolescentes disponíveis em português ignoram: as dificuldades que Parks encontrou dentro dos movimentos negros por ser mulher.

