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Chefe de cozinha faz sucesso com prato feito embaixo de viaduto em SP

Mara Rasmussen Azenha coleciona elogios de colegas famosos e atrai legião de fãs ao seu restaurante “quase ao ar livre” em frente ao Teatro Oficina

Box 62

Na pandemia, o restaurante sob o viaduto evidenciou a vantagem de funcionar “quase ao ar livre” | Foto: Divulgação

A chefe de cozinha Mara Rasmussen Azenha, de São Paulo, está há nove anos instalada sob um viaduto no bairro do Bixiga, centro de São Paulo, onde comanda o restaurante Box 62 ao lado de um sacolão municipal que tem espaços concedidos para a iniciativa privada.

As mesas do restaurante ficam à sombra do viaduto Julio de Mesquita Filho, entre as avenidas Brigadeiro Luís Antônio e 9 de Julho. Ao lado estão um açougue, uma mercearia e o espaço das frutas, legumes e verduras.

A mudança para o número 557 da rua Jaceguai foi uma forma de fugir aos altos aluguéis. Na pandemia, o endereço evidenciou uma vantagem a mais: o espaço não tem paredes e Mara anuncia nas redes sociais os pratos do dia do seu restaurante “quase ao ar livre”.

Chefe de cozinha faz sucesso em frente ao Teatro Oficina

O Box 62 fica quase em frente ao Teatro Oficina do ator e diretor José Celso Martinez Corrêa, um dos seus fregueses assíduos, assim como os demais artistas da troupe.

Das mesas é possível observar o grande terreno do tamanho de um campo de futebol (11 mil metros quadrados) do apresentador Sílvio Santos, alvo de um movimento que pretende instalar ali o Parque do Bixiga.

Mara com Jefferson e Janaína Rueda, donos da Casa do Porco e Bar Dona Onça, concorridos restaurantes paulistanos | Foto: Divulgação

Formada em Letras pela USP, como atesta o diploma ao lado do caixa, Mara oferece em clima caseiro pratos prontos bem brasileiros como moqueca, lula à provençal, paleta de porco, moela, língua bovina e outros, sempre acompanhados de arroz branco ou integral, farofa, banana-da-terra frita, chip de batata doce e legumes, além da salada.

Outras opções são o cuscuz de camarão, tortas e quiches e as coxinhas, croquetes e risolis. As coxinhas com massa de batata, abóbora ou mandioca são recheadas com frango, carne seca, bacalhau, calabresa, pernil e shimeji.

Elogios da crítica gastronômica ao ‘sacolão hipster’

As coxinhas foram elogiadas por Julio Bernardo, o JB, do Boteco do JB, um dos críticos gastronômicos mais ácidos do Brasil. Em seu programa no YouTube ele aparece comendo algumas e elogiando o preparo, apresentação e até a pimenta caseira feita por Mara.

Elogios de alto gabarito também vieram do casal Jefferson e Janaína Rueda, donos da Casa do Porco e Bar Dona Onça, dois endereços gastronômicos dos mais disputados em São Paulo.

O escritor e jornalista americano radicado em São Paulo Matthew Shirts descreveu o local como “sacolão hipster”. Em um artigo na revista Veja SP ele descreve o endereço como “exótico, inusitado, charmoso demais”. Além dos pratos e salgados ele elogia também as sobremesas como arroz-doce e manjar branco.

Mara tem entre os fregueses também o escritor Reinaldo Moraes,  que lançou ali o seu livro “Maior que o mundo”, há três anos.

O escritor, tradutor e professor brasileiro Milton Hatoum, com Mara | Foto: Divulgação

Chefe trocou carreira acadêmica pela cozinha

Aos 71 anos, Mara conta que já gostava de brincar de cozinhar desde a infância em Nova Odessa, no interior de São Paulo. Depois de formada em Letras, na USP, trabalhou com tradutora, revisora e redatora em diversas editoras.

Em 1979, ela decidiu abandonar a carreira acadêmica e abriu o Bar da Terra, um dos primeiros bares da Vila Madalena, em São Paulo. Na efervescência política da época, o ponto virou um importante local de encontros de estudantes e intelectuais.

Em outra tentativa de virar professora, Mara foi morar em Ilhabela, no litoral paulista. Mas logo estava vendendo doces e fez tanto sucesso que abriu a primeira confeitaria da Ilha, chamada ‘Doces da Princesa’.

O passo seguinte no ramo culinário foi abrir um restaurante universitário no subsolo da biblioteca da Unicamp. O local foi um sucesso por seis anos, e em seguida ela abriu uma lanchonete no Itaú Cultural, na Capital, por seis meses, antes de abrir o bar Platibanda, que marcou época por oito anos na Vila Madalena.

Há nove anos, conseguiu autorização mediante licitação para abrir o restaurante Box 62. Com ajuda do filho arquiteto, montou um ambiente simples, com mesas de madeira em um ponto arejado.

O compositor e cantor Jards Macalé com Mara no Box 62 | Foto: Divulgação

Box 62 é síntese da carreira culinária

“Depois de ter experiência em vários restaurantes, considero o Box 62 uma síntese de tudo o que já fiz na vida”, comenta ela. Um dos segredos é o cardápio brasileiro de pratos feitos simples, mas saborosos.

Na pandemia, ela teve de fechar por três meses e recorreu ao programa emergencial de manutenção do emprego do governo federal para manter as três ajudantes. As empresas da região adotaram o home office e os clientes sumiram.

“Só não fui à falência porque o aluguel do espaço cobrado pela Prefeitura é baixo em relação ao mercado. É a vantagem de estar dentro do sacolão.”

Ela reabriu em julho do ano passado, e no início quase não tinha fregueses durante a semana. Aos poucos o movimento voltou a crescer.

Um jovem professor de história desempregado faz entregas de bicicleta. Ele é formado pela PUC, com curso de extensão em história andina em Quito, no Equador, mas faz entregas enquanto busca um emprego na sua área.

Boa parte dos ingredientes ela compra no vizinho Sacolão ou no Mercado Municipal da Cantareira.

Às vésperas de completar dez anos sob o viaduto, Mara sonha com a melhoria do bairro e com o dia em que o projeto do Parque do Bixiga for colocado em prática.

O projeto do parque é alvo de briga há 40 anos entre o dramaturgo José Celso Martinez Corrêa e o Grupo Silvio Santos, que pretende construir três prédios de até 100 metros de altura.

“O Bixiga seria outro se o parque fosse criado, especialmente se adotarem o projeto da Escola da Cidade e da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, que pretende desenterrar o rio do Bixiga”, comenta Mara, que nas raras horas vagas descansa em uma rede sob o viaduto e em cima do rio canalizado cuja bacia desce desde o platô da avenida Paulista até desaguar no vale do Anhangabaú, passando pelo histórico bairro do Bixiga.

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