Agronegócio sustentável é a chave para o crescimento
Ministra Tereza Cristina, da Agricultura, defende tecnologia e inovação como fundamentais para crescimento sustentável do setor
14/01/2021A engenheira agrônoma Tereza Cristina Corrêa da Costa Dias, ou simplesmente Tereza Cristina, que responde pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil, falou com exclusividade para O Especialista.
Para ela, ainda há muita concentração na pauta de exportações brasileira, em produtos e mercados, e há um temor de que haja um aumento do protecionismo mundial por causa da covid-19.
Ela disse que acredita muito na ampliação da participação do setor na economia, a partir da tecnologia e inovação, com o uso de técnicas sustentáveis. Neste sentido, a conectividade no campo, para a ministra, é fundamental.
Tereza Cristina diz, também, considerar um erro ligar desmatamento à produção agropecuária e que é imprescindível a regularização fundiária. Tudo isso, num setor que representa 21% do PIB e 20% dos empregos. A seguir, os principais trechos da entrevista:
O Especialista – O Agronegócio tem sido um dos pilares da economia durante a pandemia. Impulsionou o PIB e tem sido destaque nas exportações. Como será o ano de 2021 para o segmento, que papel a senhora espera para o setor?
Ministra Tereza Cristina – Sim. É fato. O agro não parou. Trabalhamos duro – governo e produtores – para garantir a continuidade do abastecimento, fornecendo alimentos de qualidade para todos os brasileiros. Além disso, conseguimos exportar e bater recorde de safra. Foi um dos setores que cresceu durante a pandemia, o que nos coloca numa posição muito favorável para ajudar o País na retomada econômica, e respondeu muito bem ao estímulo representado pelos altos preços praticados no ano passado.
2020 foi um ano dificílimo e certamente os desafios continuam. Estamos atravessando um período único na história recente e, ainda, não temos uma clareza sobre esses efeitos. Avaliamos, porém, que o Brasil tem sabido aproveitar a oportunidade para se firmar como fornecedor confiável de produtos do agronegócio. Demos um grande passo ao conquistarmos 108 novos mercados, nestes dois anos do governo do presidente Jair Bolsonaro, para colocar nossos produtos no mercado internacional, como fruto de um esforço estratégico e diplomático do Governo Federal. Claro que é uma grande vitória também dos nossos produtores, com sua dedicação contínua e incansável em aperfeiçoar processos e utilizar tecnologia no meio rural.
Mas, sem dúvida, continuará sendo um desafio diversificar nossa pauta exportadora – ainda concentrada em poucos produtos e mercados. Essa é uma tarefa mais complicada. Aproveitamos a oportunidade oferecida pelo crescimento econômico e aumento de demanda, no caso da China. Uma das consequências foi essa concentração. Para o longo prazo, temos que trabalhar – internamente e nas negociações – para acessar outros mercados e aumentar o leque de produtos da nossa pauta, além de agregar valor à produção agrícola e pecuária do Brasil.
Queremos que essas posições se consolidem no pós-pandemia. Observamos, com certa preocupação, a possibilidade de recrudescimento do protecionismo agrícola após a Covid-19. Esse não é um caminho que levará, a meu ver, a maior resiliência das cadeias agroalimentares globais.
Será ainda mais importante o trabalho que vem sendo feito pela Conab, de fornecimento de dados de qualidade sobre o setor, o que permite um trabalho mais qualificado do Ministério, com uso da inteligência estratégica do agro para elaboração de políticas públicas.
Também será necessário reforçar o trabalho que estamos promovendo pelo desenvolvimento da agricultura familiar, tanto na oferta de crédito, quanto na digitalização da assistência técnica e extensão rural, que leva informação e tecnologia.
Queremos ampliar ainda mais a conectividade do homem do campo para permitir o acesso a informações e programas importantíssimos para o futuro do agro, como o Pronasolos, que leva ao produtor informações mais detalhadas sobre a qualidade do solo brasileiro. Tem também o Programa Bioinsumos, com ampliação da oferta de insumos biológicos para a produção nacional.
Outra questão a destacar é a grande atenção dada pelo público externo e, mesmo interno, às questões de preservação ambiental e a ligação, na grande maioria das vezes incorreta, entre a atividade agropecuária e o desmatamento. É certo que precisamos concluir a implementação do Código Florestal e promover a adequação ambiental dos produtores que não estão em conformidade. Mas estou convencida: o Brasil tem muito a ganhar com isso. Nossa produção é majoritariamente obtida de maneira ambientalmente amigável.
Enfim, não posso deixar de mencionar os desafios representados pela falta de regularização fundiária de grande área rural do nosso País. São antigos projetos de colonização e assentamentos da reforma agrária que estão pendentes de titulação. Acredito que a entrega do título de propriedade é o primeiro passo para incluir esses estabelecimentos nos sistemas de produção e promover, inclusive, sua adequação ambiental.
Já avançamos muito e sabemos que podemos ir muito mais. O agronegócio tem, nos últimos anos, colecionado excelentes resultados, transformando nosso País numa potência agroambiental. Temos todas as condições para continuar aumentando nossa produtividade com a difusão de novas tecnologias, aproximando cada vez mais o produtor nacional das necessidades do mercado nacional e internacional.
Inovação e tecnologia é uma de minhas bandeiras e estou atenta a esse desenvolvimento porque só por meio da ciência, tecnologia e inovação que nós vamos continuar colocando o Brasil como protagonista do agronegócio sustentável e moderno.
Devemos colher uma safra recorde de grãos em 2021 e há grandes investimentos em curso na produção de carnes, por exemplo. Dado que a demanda por produtos agrícolas continua elevada esperamos que o este ano seja também muito positivo para o setor. Boa parte das safras de soja e milho já foi comercializada, com preços remuneradores para o produtor. A colheita já está se iniciando e esperamos com isso uma acomodação dos preços e, consequentemente, uma redução da pressão sobre o índice de inflação. O setor deve crescer em 2021 e, com isso, ajudar na retomada da economia brasileira.
A agricultura e pecuária moderna terão de ser mais eficientes e produtivas. Qual avaliação a senhora faz dos avanços do setor, que espaços ainda existem e comparativamente qual nossa situação em relação aos concorrentes internacionais?
A produção brasileira atingiu um nível de excelência comparável aos melhores do mundo. O Brasil é o terceiro maior exportador mundial de produtos agrícolas e, se consideramos apenas o saldo, o Brasil é, de longe, o maior exportador. Somos os principais exportadores de açúcar, café, suco de laranja, soja e carnes. Estamos entre os líderes em algodão, milho e celulose. Porém, trata-se de um setor heterogêneo. Temos níveis excelentes de produtividade e aplicação de tecnologia, mas ainda convivemos com algumas regiões e produtores que usam pouca tecnologia e que não obtêm bons resultados. Estamos trabalhando para melhorar isso.
Temos que nos orgulhar do que já conquistamos. Na safra passada, produzimos 256 milhões de toneladas de grãos. Para a safra em curso, devemos colher 266 milhões de toneladas, embora essa ainda seja uma previsão prematura, pois recém-iniciamos o plantio da segunda safra, que é muito importante para o Brasil.
A propósito, no Brasil, plantamos cerca de 20 milhões de hectares por ano mais de uma vez, ou seja, colhemos duas ou, às vezes, onde há irrigação, três safras na mesma área no mesmo ano-safra. Nenhum País do mundo faz isso nessa escala. É uma utilização muito intensiva da terra, que possibilita produzir mais sem abrir novas áreas. Chamamos de efeito “poupa terra” – ao invés de aumentar a produção pela incorporação de novas áreas produzimos mais intensivamente na área já utilizada.
Nessa pandemia, o Brasil se firmou como fornecedor confiável de produtos do agronegócio. Enquanto alguns países restringiram suas exportações, o Brasil continuou atendendo aos seus clientes.
Temos potencial para ampliar nossa inserção no mercado agrícola internacional por meio do aumento da produção, da produtividade e da competitividade do agronegócio, conjugado à abertura de novos mercados.
Hoje, a agricultura se expandiu, se modernizou e o Brasil se tornou uma potência agroambiental. O agronegócio é responsável por 21% do Produto Interno Bruto (PIB) e 20% dos empregos no País. Pessoas em mais de 200 países, sejam da Europa, Ásia, África, Américas – têm algum alimento no seu prato que vem da nossa agropecuária. Tudo isso aliado a práticas de sustentabilidade e preservação ambiental, seguindo a exigência mundial para que a demanda por alimentos seja atendida com impacto ambiental mínimo e baixo custo.
Um dos maiores problemas vividos pelas pessoas tem sido a alta dos preços. Há fatores como aumento da demanda e, também, entressafra. Como deverá ser o comportamento do setor neste ano e o fato de prevermos novo recorde de produção não pode fazer com que haja estabilidade ou queda de preços?
De fato, os preços subiram bastante no ano passado. Foi uma combinação da taxa de câmbio com alta demanda e os preços internacionais. Porém, como mencionei, o setor respondeu muito bem a esse estímulo: plantou uma safra de grãos que caminha para ser recorde. Aumentaram também os investimentos na produção de carnes. Esperamos para este ano que os preços se acomodem um pouco, embora ainda permaneçam elevados numa perspectiva histórica.
O Mapa monitora o desempenho de todas as culturas ao longo do ano para garantir o equilíbrio entre oferta e procura pelos produtos do setor. É normal que, em determinado período, e motivado por fatores específicos, preços possam subir ou cair.
O Governo Federal considera saudável para a sustentação a longo prazo das cadeias produtivas que a formação de preços seja dada pelas condições do mercado. E, nesta linha, tem procurado atuar com medidas que não causem rompimento de contratos que possam desestabilizar as cadeias produtivas. Nesse sentido, o governo facilitou a importação de produtos importantes, como arroz, milho e soja, eliminando a cobrança do imposto de importação para limitar a alta dos preços.
Podemos ter segurança de que o setor reage aos preços remuneradores, ampliando a produção, o que faz com que os preços recuem, e gerando novos investimentos e empregos.