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O futuro das cidades, segundo Jaime Lerner

Considerado pela 'Time' um dos pensadores mais influentes do mundo, urbanista pôs em prática o ESG antes de a sigla existir

O urbanista Jaime Lerner

Jaime Lerner morreu no final de maio, aos 83 anos, deixando um legado concreto da aliança entre qualidade de vida e sustentabilidade | Foto: Divulgação

No final dos anos 1960, a ideia de cidade sustentável soava futurista, distante demais dos planos diretores das grandes cidades brasileiras. Mas não para o jovem urbanista Jaime Lerner.

O conceito, aliás, ainda não era usado para soluções que melhorassem a vida das pessoas preservando meio ambiente e recursos naturais. Algo sustentável era, àquela altura, algo que se pagasse no final do dia.

O arquiteto recém-formado criou o Instituto de Planejamento Urbano de Curitiba e gastou o assento dos sofás das salas de espera de empreiteiros, empresários e políticos para convencer de que todos em Curitiba ganhariam mais com soluções inteligentes no lugar de obras monumentais, características do período dos governos militares. Conseguiu.

O arquiteto convenceu empreiteiros e políticos que o racionalismo tinha mais a entregar do que intervenções monumentais no tecido urbano

Em 1971, Jaime Lerner assumiu a prefeitura da capital paranaense, cargo que ocupou por mais dois mandatos, até se tornar governador do estado. Fez da capital conservadora, modelo mundial de urbanidade. Seus programas de baixo custo e alta eficiência são replicados até hoje pelas cidades mais inteligentes do mundo

Considerado pela revista Time em 2010 um dos 10 pensadores mais influentes do mundo, o arquiteto morreu, aos 83 anos, no final do mês passado. Deixou muitas lições, algumas que só recebem atenção agora, com a emergência da agenda ambiental batendo na porta de governos e empresas.

Jaime Lerner, influente urbanista brasileiro, morre aos 83 anos,© Ricardo Perini
Residência que o urbanista projetou, construiu e viveu com a família de 1962 até 2002

Lerner foi um ator, muito mais do que o pensador reconhecido pela revista norte-americana. Suas soluções revolucionárias, como o BRT, o sistema de ônibus público que deu ao transporte viário eficiência do metrô, não estão devidamente explicadas nas bibliotecas de universidades, como pode sugerir o título conferido pela Times.

Também não é fácil achar algo publicado sobre a obra do paranaense em prateleiras das livrarias elegantes que comercializam títulos de arquitetura. Mas no seu trabalho, aplicou, sem concessões, premissas como economia de recursos, preservação da natureza e o máximo aproveitamento da cultura e produção locais para estimular a convivência social igualitária de espaços públicos, sem a qual não se pode, hoje, falar em sustentabilidade.

As ideias sustentáveis que Jaime Lerner pôs em prática, antes de o conceito se sustentabilidade

Mais transporte coletivo, menos carros

Sistema BRT em Curitiba/PR. | Download Scientific Diagram
As Estações Tubo, de Curitiba, foram reproduzidas em mais de 200 cidades do mundo

Estímulo ao trânsito de pedestres pelas cidades

Idealizou e desenhou a Rua XV, no centro de Curitiba, a primeira rua exclusiva para pedestres no Brasil.

Lerner dizia que o maior equívoco das cidades era a supervalorização do transporte individual. “O maior erro é o excesso de dependência do automóvel. Todo o espaço público está privatizado pelo automóvel e para a infraestrutura que ele demanda”, criticava.

Respeito aos rios, cursos de água e espaços verdes

O Parque Urbano da Orla do Guaíba é um gesto importante da Prefeitura de Porto Alegre, devolvendo para a cidade e seus cidadãos o uso e apreciação de um de seus mais preciosos patrimônios naturais: a Orla do Guaíba. Era um lugar de enchentes, que o escritório de Lerner transformou em ponto de turismo e cultura.

“O pessimista não é mais realista que o otimista. O problema do pessimista é que ele acaba torcendo para que os desastres aconteçam e confirmem suas previsões”, dizia ele.

Estímulo à ocupação dos espaços públicos

Seu escritório desenhou praças e espaços públicos em todo o Brasil e outros locais do mundo, seguindo o princípio de aproximação cultural como forma de minimizar o abismo social do Brasil em suas metrópoles.

“Todas as cidades deveriam ter um sonho e perseguir esse sonho. Em Curitiba, nós tivemos vários sonhos”, disse o arquiteto à revista Law, em 2016.

Orla do Rio Guaíba:  projeto devolveu espaço de lazer e cultura a Porto Alegre

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