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Agência Estado

A caixa-preta do petróleo

Quando se abre a caixa preta da Petrobras nos deparamos com várias outras caixinhas com os seus mistérios

Combustíveis

Pela atual política de paridade de preços, a Petrobras deve repassar os aumentos de custos com a compra do petróleo | Foto: Getty Images

Sob o manto sagrado do “petróleo é nosso”, muitas coisas foram praticadas. Boas e ruins. Mas, antes de abordá-las, devemos tratar do conceito “o petróleo é nosso”. A expressão traz embutida a aspiração nacionalista de autonomia frente às poderosas irmãs da indústria que controlavam o negócio no século passado. Cunhada nos anos 40, teria sido dita por Getúlio Vargas quando se descobriu petróleo na Bahia.

O sentimento autonomista cabia bem tanto no figurino tenentista, que defendia a industrialização do país e a redução da dependência ao exterior, quanto no menu esquerdista, que queria fragilizar o capitalismo internacional.

Ao sabor dos embates ideológicos, criou-se a Petrobras, que, no seu início, não propunha o monopólio da exploração e do refino. Mas que, no embalo do nacionalismo, foi transformada em uma gigante que não só explorava como importava e refinava o petróleo que distribuía, em condições privilegiadas frente aos demais subprodutos do refino.

A Petrobras foi uma das molas propulsoras do desenvolvimento da indústria nacional e da criação de tecnologias de ponta na exploração do petróleo. É, sem dúvida, uma das melhores empresas do mundo no ramo e líder na exploração em águas profundas. Porém, à sombra das justificativas que agradavam a direitistas e esquerdistas, construiu-se uma empresa de existência ambígua, meio privada meio estatal. Que cuida de seus lucros tal qual uma empresa de capital privado e distribui benefícios para os seus tal qual uma generosa estatal.

Pois bem, ora agindo como estatal, ora agindo como empresa privada, a Petrobras volta e meia se depara com os custos dessa ambiguidade. Em setembro, em audiência geral na Câmara, o atual presidente da companhia, o general da reserva Joaquim Silva e Luna, foi explicar por que o preço da gasolina e do gás de cozinha estão tão altos. Silva e Luna declarou que o preço dos combustíveis no país inclui o custo de produção da empresa. E que uma eventual intervenção estatal nos valores precisaria ser compensada pelos cofres públicos.

Ainda segundo ele, “a Petrobras é uma sociedade de economia mista sujeita a uma rigorosa governança, não tendo espaço para nenhum tipo de aventura”.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em sua participação no Macro Day 2021, promovido pelo BTG Pactual, afirmou que o banco vê o repasse de preços de combustíveis pela Petrobras ser feito de modo “muito mais rápido” do que o realizado em outros países. O emblemático da história é a declaração do presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), de que os brasileiros são todos acionistas da Petrobras — o que é parcialmente verdade.

Além do dilema existencial da Petrobras existe outro, de caráter regulatório: devemos realmente criar um mercado competitivo de petróleo? Como fazê-lo? Vender as refinarias e a distribuidora, o que já foi feito, resolverá o problema dos preços dos combustíveis no país? Não é uma resposta fácil.

A criação de um mercado competitivo depende de ações regulatórias que liberem o uso das infraestruturas da Petrobras para a distribuição do combustível, bem como a venda de etanol diretamente para as distribuidoras e os postos de gasolina.

Impõe também uma trava à abusiva cobrança de impostos estaduais na venda dos produtos. No Brasil de hoje, os estados arrecadam quase tanto, em termos percentuais no preço de venda ao consumidor, quanto a Petrobras, que explora e refina o petróleo. Em fim, quando se abre a caixa preta da Petrobras nos deparamos com várias outras caixinhas com os seus mistérios.


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