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Marcus Nakagawa

Marcus Nakagawa

A necessidade de ensinar o ABC do ESG

Para mostrar o engatinhar no tema, numa pesquisa com 124 empresas internacionais metade considera os relatórios ESG como um exercício de “ticar a caixinha”

Mulher de costas com blazer claro e pessoas ao fundo viradas de frente prestando atenção em aula, alusivo ao ensino do ESG nas empresas

Segundo a EcoOnline, um terço da equipe que lidera os relatórios ESG em empresas de escala internacional tem pouco ou nenhum treinamento relevante para fazê-los de forma eficaz | Foto: Getty Images

Recordo como se fosse hoje. Em um dos primeiros estágios que fiz, tivemos um treinamento sobre os processos, as questões da empresa como missão, quais serviços e produtos existiam, além da definição exata do meu trabalho como estagiário. Eram várias pastas de capa dura, com várias folhas dentro, explicando toda a organização e ficavam em um armário específico e etiquetado no nosso departamento. O treinamento era interno com o líder da área, mas também tínhamos treinamento com alguns especialistas externos contratados para tal.

O meu maior medo era quando chegavam os auditores que vinham para tomar nossa “chamada oral”, como falávamos antigamente na escola. E a qualquer momento, um desses auditores poderia parar você no corredor e “tomar a lição” perguntando qual é a missão da empresa e qual era a minha função na organização. Estes eram os primórdios da qualidade total nas organizações, a busca pela excelência nos processos e o tão almejado defeito zero.

O presidente da empresa fazia questão de falar sobre este assunto nas reuniões, que eu não participava, mas me contavam. E quando chegou o dia, eu como um bom “CDF”, consegui falar a missão e o que eu fazia na empresa. Nesta jornada de aprendizado, sinto que foi muito importante esta passagem.

Já no começo dos anos 2000, enquanto ainda estava nas empresas, participei e organizei muita capacitação sobre a importância da responsabilidade social e do meio ambiente para a organização. Palestras, workshops e cursos de grandes especialistas externos que estavam trazendo o conteúdo para as empresas. O Instituto Ethos na época tinha um programa muito interessante de agrupar muitas empresas e juntas debater as grandes dificuldades no processo de implementação da temática. Inclusive, trazendo os principais fornecedores das empresas para buscar montar uma cadeia de valor sustentável. A Fundação Dom Cabral tinha um processo interessante de levar a discussão para as empresas participantes do programa, juntando a academia para ajudar nos problemas que as empresas traziam.

E agora estamos repetindo este caminhar ensinando o ABC do ESG e da sustentabilidade. Para mostrar o engatinhar neste conhecimento, numa pesquisa com 124 empresas internacionais, a EcoOnline, em 2022, apresentou que 50% consideram os relatórios ESG como um exercício de “ticar a caixinha” e que 1/3 da equipe que lidera estes relatórios tem pouco ou nenhum treinamento relevante para fazê-los de forma eficaz. E só quem já fez um relatório destes sabe o que é isso. O relatório não é somente um documento a ser entregue, mas sim um diagnóstico para buscar melhorias, exatamente igual a temática do início deste artigo: qualidade, excelência e melhoria constante. E, por outro lado, a complexidade dos processos globais e as cobranças começam a ficar maiores por todos os lados e pelos vários stakeholders, como apresenta a pesquisa internacional da Fidelity’s 2022. Os analistas de temas de sustentabilidade mostram que 56% dos conselhos de administração têm uma supervisão direta na área de sustentabilidade neste ano, em comparação com os 52% do ano passado. E que o segmento de investimentos sustentáveis foi avaliado no ano passado em US$ 35 trilhões.

Mas a área ainda possui desafios importantes como os efeitos da Guerra na Ucrânia, a regulação internacional e a maior inflação em vários países em décadas. Para enfrentar tudo isso, as empresas precisam capacitar os seus vários executivos e funcionários para este modo de gestão chamado ESG. Semanalmente faço uma curadoria voluntária das vagas disponíveis no mercado e posto no meu LinkedIn. E é impressionante como repito, às vezes por meses, a mesma vaga, pois faltam pessoas no mercado capacitadas, capazes de agregar todas as ferramentas e as competências diversas necessárias na área do ESG. A consultoria Michael Page, por exemplo, revelou que cresceu 50% a busca por profissionais de ESG no agronegócio entre janeiro e maio de 2022.

Como consequência, o mercado apresenta um aumento na quantidade de cursos em ESG e suas variações. Na ESPM também estamos montando alguns cursos para exatamente suprir esta necessidade do mercado e ajudar mais pessoas a entrarem ou gerenciarem melhor a área. A Abraps (Associação Brasileira dos Profissionais pelo Desenvolvimento Sustentável) também possui um programa para desenvolvimento de carreira para a temática, com mentoria de especialistas que começaram a sustentabilidade e o ESG no Brasil.

Sinto que este é o processo tradicional quando se implementa um novo procedimento ou tema dentro dos negócios e organizações. Nas aulas, palestras e workshops tenho falado que estamos participando da história da administração, quando falamos das teorias da administração ou das várias “ondas” que fizeram as empresas chegarem aonde estão hoje. Portanto, esta é uma chamada para que você participe com o máximo de conhecimento desta história que estamos escrevendo sobre o ESG e a sustentabilidade empresarial. E fiquem atentos, pois a qualquer momento teremos a nossa “chamada oral” sobre estas temáticas.


Marcus Nakagawa é professor da ESPM e coordenador do Centro ESPM de Desenvolvimento Socioambiental

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