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Sidney Klajner

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Desospitalização: quando o menos é mais

Transformação digital nas organizações de saúde e avanços da medicina reduzem tempo de internação dos pacientes e vários procedimentos agora podem ser realizados em ambulatório

Hospital tecnologia

Hospitais terão de se transformar em centros de alta complexidade, capazes de entregar excelência e resolutividade | Foto: Getty Images

Avanços da medicina reduzem tempo de internação dos pacientes e vários procedimentos agora podem ser realizados em ambulatório. Mas isso não significa que precisamos menos dos hospitais.

Quando eu comecei a operar, a colestectomia, que é a cirurgia para retirada da vesícula, exigia um grande corte no abdome do paciente e ele ficava três dias internado no hospital. Novas técnicas diminuíram o tamanho do corte, e o paciente passou a ter alta no dia seguinte. Hoje, com a laparoscopia, ele volta para casa algumas horas depois do procedimento.  E isso pode ser feito até em uma unidade avançada, como a que o Einstein tem em Perdizes, dispensando a estrutura de um grande hospital.

Esse processo, que chamamos de desospitalização, vem acontecendo em praticamente todas as especialidades médicas. Na Cardiologia, as cirurgias de “peito aberto” para revascularização do miocárdio (“ponte de safena ou mamária”), que exigem pelo menos uma semana de internação, cedem cada vez mais lugar às intervenções por cateterismo para implante de stents, com média de alta em dois dias e retomada das atividades de rotina do paciente muito mais rapidamente. Na Ortopedia, quem colocava prótese de quadril e ficava seis ou sete dias no hospital, atualmente volta para casa em apenas dois dias, graças a avanços na técnica cirúrgica e nos materiais, além de medidas como a visita prévia de uma equipe à residência do paciente para orientar sobre adaptações que ajudarão no pós-operatório e na fisioterapia.

Eu poderia citar inúmeros outros exemplos de como o progresso do conhecimento médico, das técnicas cirúrgicas, da tecnologia em termos de equipamentos e novos dispositivos vêm permitindo tratamentos menos invasivos e mais eficazes, com menor tempo de internação e recuperação. Mas esses não são os únicos aceleradores do processo de desospitalização.

A transformação digital nas organizações de saúde é outro elemento que ajuda a encurtar o tempo de permanência dos pacientes nos hospitais. No Einstein, por exemplo, a Central de Monitoramento Assistencial monitora, por meio de um sistema de inteligência artificial, os dados e sinais vitais de todos os pacientes internados, emitindo alertas em caso de alterações relevantes, o que permite intervenções rápidas, evitando complicações que prolongariam a permanência na unidade hospitalar. 

Também não podemos esquecer outras soluções que permitem cuidar e acompanhar o paciente na casa dele, como a telemedicina, home care, exames em domicílio, wearables e recursos de monitoramento remoto.

A desospitalização é um caminho sem volta. Teremos cada vez mais períodos mais curtos de internação, procedimentos que poderão ser feitos em ambulatório ou no sistema de day hospital e cuidados que migram do hospital para a residência do paciente.

A esta altura, o leitor pode estar se perguntando: será que o número de hospitais ou de leitos hospitalares vai diminuir, já que muitos serviços não precisam mais ser feitos ali? A resposta é não.  Os hospitais continuarão sendo necessários por conta das doenças associadas à longevidade, das enfermidades que exigem tratamentos mais complexos, das urgências e emergências que continuarão existindo sempre e até de situações que emergem de maneira imprevista, como a Covid-19 que, mesmo depois do tratamento, deixa graves sequelas de longo prazo em alguns indivíduos.

O que os hospitais têm de fazer é rever seus modelos de assistência, alicerçados em critérios de qualidade, eficiência e segurança. Instituições que insistirem no modelo hospitalocêntrico praticarão uma medicina mais cara, com desperdício de recursos e pior experiência para o paciente. Cada vez mais, os hospitais terão de se transformar em centros de alta complexidade, capazes de entregar excelência e resolutividade nesses tratamentos e também capazes de desospitalizar o paciente sempre que possível e com toda a segurança.


Sidney Klajner é Cirurgião do Aparelho Digestivo e Presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein. Possui graduação, residência e mestrado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, além de ser fellow of American College of Surgeons. É coordenador da pós-graduação em Coloproctologia e professor do MBA Executivo em Gestão de Saúde no Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa do Einstein.

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