close

Maroni João da Silva

Em finanças, como na vida, o jogo só termina quando acaba

O acesso a uma conta bancária facilita o planejamento financeiro das famílias, enquanto a bancarização movimenta a economia via consumo

Crédito

Ao otimizar a circulação do dinheiro, operações bancárias potencializam as demandas por bens e serviços | Foto: Getty Images

A aceleração das transferências interbancárias, através do Pix, poderá mudar a percepção de muitos não-correntistas sobre a importância social dos bancos e da moeda. Ao otimizar a circulação do dinheiro, essas operações potencializam as demandas por bens e serviços de seus beneficiários mais diretos.

Por outro lado, despertam sonhos e expectativas de mudanças estruturais em segmentos ainda não inclusos no circuito de consumo regular. Funcionam também como facilitador de outras modalidades de negócio, movimentando distintas cadeias de valor em sinergia com o próprio setor financeiro.

É preciso levar em conta que esse dinamismo socioeconômico é fruto inclusive da crescente bancarização do Brasil e da democratização do crédito, duas condições sine qua non para encorajar o empreendedorismo. Dados do Banco Central indicam, por exemplo, que mais de 85% da população adulta brasileira tem algum tipo de relacionamento bancário.

Contudo, um em cada três brasileiros não dispõe de conta bancária, segundo à mesma instituição. Assim, dependendo de outras variáveis de perfil socioeconômico e até cultural, além da expansão do sistema em si, há espaço para o crescimento do universo correntista no Brasil.

Acredita-se que o acesso a uma conta bancária facilita o planejamento financeiro das famílias, enquanto a bancarização movimenta a economia via consumo e, claro, em consequência do giro do dinheiro. Pode-se acrescentar que, em certos casos, a conta opera também como um passaporte para a obtenção de cartão de crédito e outras benesses que garantem status diferenciado ao cliente, dentro e fora do banco;

Porém, não é menos verdade que, dependendo do grau de educação financeira das famílias e dos correntistas, individualmente falando, todo esse capital – econômico e simbólico – poderá se transformar em uma faca de dois gumes. Por exemplo, em um piscar de olhos o balanço entre renda e consumo poderá descambar para o passivo a descoberto.

Nesse caso, rompe-se o equilíbrio entre o que sai debita e o que entra credita – parafraseando-se o velho sistema das partidas dobradas da contabilidade. Assim, ao invés de representar a última fronteira para o sucesso, o dinheiro poderá se transformar em um grande pesadelo, encarnando um símbolo “controverso e sem limites”, conforme alguns de seus significados socioculturais,

Mas, “os segredos de quem tem”, revelados pelo autor de um best-seller de autoajuda, parecem relativizar os riscos de lidar com fluxo de caixa em excesso temporário. Por outro lado “pensar grande”, tornou-se um mantra de muitos empreendedores de sucesso, no Brasil. E não por acaso, a inspiração veio de outro best-seller, ou seja, “Os segredos da mente milionária”.

Essas e muitas outras tantas publicações com perfil literário distinto representam uma espécie de catecismo de proprietários, executivos e funcionários de grandes e bem-sucedidos magazines brasileiros. É o que eu mostro em um de meus livros, “O lado místico do comércio”, fruto da tese de doutorado em Ciência Sociais, realizada na PUC-SP, e publicado pela Appris Editora.

Muitos consumidores, correntistas ou não, são também encorajados a realizarem seus sonhos de grandeza baseados em literatura, sagrada e profana, que propaga a prosperidade, aqui e agora. Para essas correntes de pensamento, algumas de perfil teológico, não existe pecado algum em almejar bens de qualquer natureza, para alimentar necessidades e desejos mundanos, inclusive por dinheiro.

Mas para o bem-estar geral de todos os participantes dessa ciranda da felicidade e da alegria, é preciso alertar, em alto e bom som. Embora em uma economia de mercado as regras de conduta e atuação dos atores fiquem por conta do laissez-faire, em se tratando de dinheiro, os jogadores precisam tomar cuidado redobrado – sempre – antes, durante e depois do jogo.

A falta de um bom preparo técnico e psicológico poderá comprometer não apenas o espetáculo, mas a própria integridade dos corpos de alguns dos envolvidos na disputa. Qualquer uma das partes precisa estar pronta para dar o melhor de si, inclusive em circunstância nem sempre previsíveis, como é praxe no mundo dos negócios, em plena era digital.

Às vezes, ganhar significa se manter vivo e garantir vaga para a disputa seguinte, colocando em prática outro mantra da educação continuada: aprender, desaprender e reaprender. O cotidiano das pessoas em geral também é assim, em qualquer campo de atuação e não só em matéria financeira. E por fim, uma regrinha básica da vida, enquanto tal: o jogo só termina quando acaba.

Abra sua conta


@maronisilva é jornalista, escritor, Mestre e Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP, sócio-diretor da Textocon, Comunicação & Cultura Organizacional, autor dos livros Magazine Luiza – Negócio e Cultura e O lado místico do comércio, além de coautor de Gestão de Pessoas no século XXI: Desafios e Tendências para além de modismos.

Assine o Safra Report, nossa newsletter mensal

Receba gratuitamente em seu email as informações mais relevantes para ajudar a construir seu patrimônio

Invista com os especialistas do Safra