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Maroni João da Silva

Igualdade social na diversidade, mito ou verdade

Embutida na diversidade social corporativa cultua-se o individualismo sob o rótulo do empreendedorismo em prejuízo do bem coletivo

Diversidade

A diversidade tornou-se uma moeda de troca, agregando valor simbólico ao capital social das empresas | Foto: Getty Images

De uns tempos para cá, a diversidade tornou-se uma espécie de panaceia, no mundo empresarial. Pessoas que devido a certas características identitárias, não eram “percebidas” pelos recrutadores de RH, quase de repente, tornaram-se “mais iguais”.   

Sem entrar no mérito da positividade dessa visibilidade relativa, este artigo visa tangibilizar as consequências sociais da ressignificação das diferenças. Traduzindo, qual seu impacto fora do chão de fábrica das empresas, nos embates pela construção de uma sociedade menos desigual, estruturalmente.  

É sabido e comprovado que, via cultura de negócios, a diversidade adquiriu duplo significado. Do ponto de vista das representações, tornou-se uma moeda de troca, agregando valor simbólico ao capital social das empresas.

Esse ganho invisível transparece na melhoria da imagem das empresas perante seus stakeholders. Adicionalmente, relativiza conflitos, facilitando a interação entre os times e o compartilhamento de ideias inovadoras.

Por outro lado, sob a ótica econômica, a pluralidade dos quadros de pessoal reverbera no peso do valor patrimonial das organizações. Esse quantum torna-se palpável nos altos e baixos dos papeis em fundos de investimentos e bolsas de valores, por exemplo.

Da mesma forma, ao distensionar as práticas relacionais internas das empresas, a cultura da diversidade impulsiona a produtividade do trabalho. Esse ganho resulta da estabilidade do clima organizacional, que, no geral, aumenta a motivação e satisfação profissional.    

À primeira vista, os efeitos da diversidade social corporativa parecem se esgotar nas dimensões simbólica e econômica aqui descritas. Só que não, parafraseando um tipo de repertório linguístico já comum nas redes sociais.

Ocorre que algumas companhias se apropriam de certas reivindicações sociais, inclusive com o intuito de cultuar seu viés mais glamuroso. Ao mesmo tempo, busca-se reificar o apelo mais econômico dessas demandas, visando mitigar seu conteúdo sociopolítico. 

Não raro, essa narrativa também cria e propaga uma inversão de valores, que estrutura práticas relacionais instrumentais. Ou seja, embutida na diversidade social corporativa cultua-se o individualismo sob o rótulo do empreendedorismo em prejuízo do bem coletivo.   

Enquanto fato organizacional específico, o “apagamento” das diferenças não ocorre por acaso no mundo corporativo. Exerce também uma função latente, sociologicamente falando, contribuindo desta forma para a preservação do status quo.

A priori, não há certezas de que fora das empresas, a dinâmica social se processe exatamente dessa forma. Pode-se afirmar, contudo, que sob a perspectiva da mudança estrutural, o “apagamento” das diferenças também “esfria” os movimentos sociais.

Parte desse “esfriamento” ocorre por conta da mudança de percepção dos agentes sociais em relação as demandas por igualdade. Impactados pelos efeitos da diversidade, eles passam a interpretá-las como se fossem apenas individuais e não coletivas.

Em tempos de crise conjuntural como a que estamos vivenciando atualmente, tais efeitos são ainda mais corrosivos. São capazes de desconstruir qualquer tentativa de avanço da mobilidade social vertical ou horizontal.

As consequências macroeconômicas desse cenário parecem impactar a dinâmica social em duas direções umbilicalmente interligadas. De um lado, as carências materiais inibem as consciências mais esclarecidas sobre as alternativas de superação e de outro, parte significativa da sociedade civil torna-se amorfa.

Ao fim e ao cabo, vemo-nos todos diante do desafio de ter que desfazer as armadilhas que um bem menor impõe sobre a travessia rumo à construção social do bem comum. Há que se reconhecer que a inclusão social corporativa tem prós e contras e que sua geração de valor não é ad infinitum.   

Em tese, pode haver muitos caminhos para chegar a bom termo, mas não existem soluções fáceis. Uma coisa é certa: a caminhada será longa e a estrada, tortuosa e cheia de obstáculos. Torcemos, pois, para que prevaleça o bom combate.     

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@maronisilva é jornalista, escritor, Mestre e Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP, sócio-diretor da Textocon, Comunicação & Cultura Organizacional, autor dos livros Magazine Luiza – Negócio e Cultura e O lado místico do comércio, além de coautor de Gestão de Pessoas no século XXI: Desafios e Tendências para além de modismos.

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