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Claudio L. Lottenberg

Reabertura pós-covid em grande estilo – mas em Nova York

Nova York prepara um megaconcerto para a reabertura da cidade, e países da Europa aceleram a vacinação, enquanto o Brasil patina no combate à covid-19. Tudo que precisamos é tornar esse processo mais célere

Nova York pós covid

Cerca de 136,6 milhões de pessoas (41,2% da população) já foram completamente imunizadas nos Estados Unidos | Foto: Getty Images

O jornal “The New York Times” informa que, para marcar em grande estilo a reabertura da cidade após “um ano de pandemia brutal”, o prefeito, Bill de Blasio, planeja um megaconcerto a ser realizado no icônico Central Park. Seria, diz a reportagem, a “melhor prova de que a cidade de Nova York voltou à sua glória total”.

Os Estados Unidos ainda ostentam a infeliz marca de maior número de óbitos causados pela covid-19 até o momento. Já são mais de 592 mil, segundo o CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças, na sigla em inglês), e a contagem prossegue. Mas outros números por lá são de fato a se comemorar: cerca de 136,6 milhões de pessoas (41,2% da população) já foram completamente imunizadas (duas doses ou dose única, a depender da vacina). Nada menos que 297,7 milhões de doses foram ministradas. Pouco menos de 450 milhões de testes foram realizados.

Não será, claro, uma tarefa fácil realizar tal concerto, até porque há moradores da cidade que relutam em tomar a vacina, principalmente em áreas mais carentes – mas em casos assim, muitas vezes grupos comunitários vão de porta em porta chamando as pessoas para serem vacinadas. Para o show no Central Park, poderá haver inclusive áreas separadas, para vacinados e não-vacinados.

Já o Brasil só pode olhar para tais eventos e imaginar como será quando chegar sua vez – que, a tomar como base os números de combate à doença até aqui, não está em um horizonte próximo. Por aqui, não é possível pensar numa abertura nas mesmas proporções por enquanto.

Senão por outro motivo, o país está na iminência de uma terceira onda de covid-19. O relatório mais recente da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) diz que no período de 16 a 29 de maio, a média diária de casos no país ficou em 63 mil, com 1,9 mil óbitos diários (em média) – números similares aos das semanas anteriores; o Brasil está num platô, com elevadas taxas de incidência e mortalidade por covid-19.

Essa terceira onda, além disso, encontrará o país num momento em que hospitais e UTIs se encontram ainda em situação de saturação – ainda de acordo com o relatório da Fiocruz, a ocupação de leitos de UTI para adultos está em níveis críticos em 20 das 27 Unidades da Federação. “Ainda teremos um longo tempo de necessária articulação entre medidas e ações de imunização. Isso exigirá a manutenção das medidas de isolamento social, uso de máscaras, higiene das mãos, não aglomeração, até que tenhamos cobertura vacinal de mais de 75% da população e redução da transmissão, incidência de casos, mortalidade e letalidade”, avaliam os técnicos da fundação.

Eles ainda recomendam “a continuidade de programas e ações de mitigação da pobreza, distribuição gratuita de máscaras, sabão, álcool 70% e medidas de rastreio e isolamento de contactantes”. Por aí, vemos a distância a que estamos de qualquer possibilidade de algo na escala de um megaconcerto no Central Park.

A vacinação segue em ritmo lento: temos pouco mais de 14% da população vacinada com duas doses. Tudo isso quando estamos próximos do inverno no hemisfério Sul – o que favorece não só as aglomerações como a transmissão de mais doenças do trato respiratório. A menos que o PNI (Programa Nacional de Imunização) ganhe velocidade, veremos essa onda chegar e agravar ainda mais a situação crítica em que o país se encontra.

Países na Europa têm se alternado em fazer aberturas e logo voltar a restringir circulação e atividades, devido a novos avanços de contágio e mortes. A França, por exemplo, já realizou três lockdowns; o fim do terceiro chegou em 19 de maio, mas ainda há diversas limitações em vigor. A Alemanha também ficou meses em lockdown, e no dia 1º deste mês reduziu o nível de risco para a covid-19 no país de “muito alto” para “alto”. O ministro alemão da Saúde, Jens Spahn, disse que a situação está “melhorando muito” – mas reconhece que “ainda estamos no meio da pandemia”. Cerca de 43% dos alemães já receberam a primeira dose de vacina.

Sempre será oportuno lembrar: a saída da situação em que nos encontramos passa necessariamente pela vacinação. A demora em fazer avançar a imunização não só impedirá que se realizem celebrações de reabertura – e o Brasil certamente está ansioso por algo como o que Nova York planeja para breve – como pode mesmo atrasar a recuperação. Em que pesem os preços de commodities em alta, que favorecem um país exportador desses itens como o nosso, há efeitos negativos sobre a inflação e a geração de empregos no volume necessário para favorecer as famílias mais necessitadas.

Que já estejamos vacinando é algo positivo. Tudo que precisamos é tornar esse processo mais célere. Controlar a doença para que possamos pensar em uma retomada mais vigorosa não significa que eliminaremos a covid-19, que está aqui para ficar. A luta vai continuar depois que a pandemia tiver passado. Mas com uma população vacinada, será muito mais factível planejar uma volta ao normal – e mesmo pensar em uma grande celebração, para encerrar essa longa e árdua separação com as pessoas reunidas para comemorar.


Claudio L. Lottenberg é mestre e doutor em Oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp), presidente do Instituto Coalizão Saúde e do conselho do Hospital Albert Einstein

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