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Stephan Kautz

Recuperação das economias desenvolvidas pode trazer riscos aos preços dos ativos

Vacina acelerou retomada e diferença de crescimento entre países em 2021; Variante Delta traz incerteza à retomada na Europa

Porto de Xangai

Maior porto do mundo, em Xangai: crescimento global pode desacelerar porque a oferta não acompanha o entusiasmo da demanda, aumentando a inflação e puxando alta dos juros | Foto: Getty Images

A recuperação econômica da pandemia tem sido rápida e forte, mas não imune a riscos.

O impacto da pandemia no PIB dos países desenvolvidos e emergentes foi profundo e bastante generalizado, em função das medidas de isolamento preventivo, especialmente no segundo trimestre de 2020.

A recuperação, especialmente depois do anúncio da eficácia das vacinas, tem sido rápida, com o PIB do 1º trimestre de 2021 em muitos países em nível já acima daquele logo antes da pandemia. Ela, é verdade, tem sido heterogênea, sendo mais forte nas economias desenvolvidas, que tiveram mais recursos para enfrentar a pandemia com programas sociais e de apoio às empresas, além de terem saído na frente na vacinação (Tabela 1).

Exemplo disso são os Estados Unidos, com o PIB 2,3% acima de 2020. Entre os emergentes, temos o pelotão daqueles que se beneficiaram do surto das commodities, como Chile, Colômbia e Brasil, e muitos, como México, Indonésia e Rússia, que ainda estão saindo da contração devida à Covid.

 O caso da China é especial, porque além dela ter uma taxa de crescimento tendencial maior do que praticamente todos os países, sofreu o impacto da Covid já no primeiro trimestre de 2020, fazendo com que os 18,3% de crescimento no começo de 2021 reflita uma comparação com o “vale” de produção de 2020 (no segundo semestre a taxa de crescimento deve baixar par 6%). Esse cenário bastante positivo, apesar da presença de retardatários na recuperação, tem dois riscos: a inflação e novas ondas da Covid.

Disseminação da cepa delta traz riscos para retomada no 2º semestre

 A dúvida em relação ao quadro positivo de retomada global tem aumentado por conta da variante do vírus que causou grandes estragos na Índia e pode atrasar a reabertura completa de muitos países.

Esse atraso pode afetar mesmo países com altas taxas de vacinação e poucas mortes nos últimos meses, como o Reino Unido (cuja recuperação no primeiro trimestre de 2021 está atrasada e contrasta com a dos EUA).  Segundo estudos preliminares do Departamento de Saúde da Inglaterra (Public Health England – PHE), a variante delta da Covid19 tem grande poder de transmissão, mesmo que as vacinas existentes continuem sendo efetivas para reduzir hospitalizações e casos graves.

A proteção completa depende das pessoas terem tomado duas doses das vacinas e também de ter uma proporção suficientemente grande de pessoas protegidas para diminuir muito o contágio. Como a maior parte dos países ainda está na fase de distribuição da primeira dose, é urgente acelerar a inoculação da segunda dose.

Para controlar o contágio da cepa delta, 80% a 85% da população têm que estar protegida, ao contrário dos 75% que se pensava ser suficiente. Isso pode, inclusive, exigir que os menores de 18 anos sejam vacinados, para evitar a transmissão do vírus, mesmo que neles as consequências da Covid sejam moderadas.

Retomada rápida e inflação já levam a uma reação das autoridades monetárias

Uma das consequências da rápida recuperação econômica concentrada no consumo de bens é que as cadeias globais de produção e distribuição não estavam preparadas para essa forte demanda.

Em uma economia bem azeitada, funcionando com pouca ociosidade, é difícil atender de pronto surtos de demanda. Além disso, restrições à movimentação de carga e dificuldade de encontrar trabalhadores durante a pandemia, mesmo em fases de aparente diminuição de contágio, foram alguns dos fatores que levaram a atrasos nas entregas dos insumos e produtos e uma consequente alta nos preços dos produtos e do frete.

Essa pressão inflacionária nos chamados preços industriais já se transmitiu em parte aos preços ao consumidor de diversos países. A inflação recente nos países desenvolvidos tem, assim, oscilado acima das metas dos respectivos países, o mesmo ocorrendo com países emergentes.

Vários bancos centrais já estão reagindo a esses dados, iniciando ou normalizando a sua política monetária, retirando os estímulos adotados no auge da pandemia. Essa retirada de liquidez e outros estímulos vai continuar nos próximos trimestres e em 2022.

Nos EUA, por exemplo, a discussão de quando o banco central vai diminuir a compra de títulos e começar a aumentar os juros está acalorada. Qualquer aperto das autoridades monetárias nos países desenvolvidos pode ter impacto nos ativos de maior volatilidade e em economias emergentes.

Cenário positivo, mas com sinais de atenção

O crescimento pode desacelerar porque a oferta não acompanha o entusiasmo da demanda, aumentando a inflação e exigindo que os bancos centrais pisem no freio. Ou porque novas cepas, como a delta, que já tem levado a um aumento de casos no Reino Unido, levem ao adiamento da abertura total das economias. A euforia atual não deve, portanto, durar para muito além do meado do ano, mesmo que o dinamismo econômico nos EUA persista até o final de 2021.



Stephan Kautz é economista no Banco Safra. Formado em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), possui mestrado em Economia pela University of Birmingham (UK) e atua no mercado desde 2000.

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