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Claudio L. Lottenberg

Saúde digital e seus muitos benefícios

Eficiência, qualidade e custos menores trazidos pelo avanço da tecnologia da informação beneficiarão a todos no Brasil

Mãe com filha no colo em consulta medica por computador

Apesar do caráter essencial do contato presencial, a saúde digital faz grande diferença na democratização do acesso à saúde | Foto: Getty Images


A importância da saúde digital ganhou espaço dentro do atual contexto da pandemia de covid-19. O avanço da tecnologia da informação tornará sua presença cada vez mais valiosa e trazendo ganhos contínuos de eficiência e qualidade, com redução de custos.

Sob o aspecto dos gastos, a melhora será particularmente sensível. Isso porque há uma certa visão disseminada de que o campo da saúde é marcado por desperdícios.

Há quem julgue que até um terço daquilo que se gasta em saúde se destina a despesas absolutamente desnecessárias. Com a incorporação de ferramentas digitais, no entanto, o setor de saúde tem a oportunidade de melhor agregar recursos, simplificar processos e, com isso, se tornar menos intensivo em pessoal no âmbito burocrático e administrativo. Isso resultará em mais transparência e em melhores gestão e governança.

O benefício se reverterá para a sociedade, tanto no setor público – que já não suporta o incremento dos custos assistenciais (estes, por sua vez, suportados por tributos gerais) – como no setor de saúde suplementar – no qual a inflação do custo médico assistencial há anos alcança a casa dos dois dígitos, sem contrapartidas de segurança.

Quanto à atividade propriamente assistencial, a telemedicina será uma poderosa ferramenta para vencermos os desafios impostos não só pelo tamanho da população brasileira – estimada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 212 milhões de habitantes – como pelas proporções continentais do país – com seus 8,5 milhões de quilômetros quadrados.

Esses dados mostram as dificuldades imensas de dar espaço e vazão, de maneira presencial, às necessidades dos brasileiros. Isso acaba gerando um atendimento de saúde ruim para a população.

Uma pesquisa Datafolha recente constatou que até 14% dos entrevistados esperavam por um exame ou cirurgia há mais de 12 meses, e cerca de 50% esperavam entre um e seis meses. Isso em São Paulo – uma das unidades da Federação com mais recursos à disposição.

A telemedicina é o desdobramento do princípio da equidade e pode chegar às pessoas pelos modelos assíncrono ou síncrono. No primeiro caso, estão à disposição os e-mails, os chats e os web services. No segundo, o paciente interage com o médico em tempo real por meio de plataformas de voz e imagem e pode contar com suporte em tempo integral. Isso tem potencial para melhorar de forma acentuada o atendimento em regiões mais desassistidas, e mesmo para desafogar as unidades de atendimento em grandes centros urbanos.

Tudo isso, claro, vai requerer que se disponha de regulamentação consolidada – a Lei 13.989 em vigor, aprovada pelo Congresso Nacional em 15 de abril de 2020, autoriza o uso da telemedicina enquanto durar a pandemia de covid-19 no país.

O Brasil está atrasado neste quesito: os Estados Unidos, por exemplo, já têm suas regras para atendimento via telemedicina desde 1996; no Reino Unido, as regras já existem desde 1998; e mesmo Angola já apresenta um cenário de regulação. Regras bem estabelecidas para esse modo de atendimento se prestam inclusive a garantir uma remuneração digna àqueles que queiram participar desse cenário.

A telemedicina, claro, jamais dispensará a assistência presencial. Ela tem a função de racionalizar o atendimento presencial – mas não dispensa a importância do médico. Fato é que ela se insere dentro de uma proposta de melhoria no direcionamento dos pacientes: muitos daqueles que hoje procuram um pronto atendimento poderiam ser mais bem atendidos em centros de atenção primária, unidades básicas de saúde, em consultórios e também pela telemedicina.

A empatia criada no contato do paciente com o médico, fruto de nossa cultura analógica e não digital, ainda não tem substituto – embora, no futuro, as crianças e os jovens de hoje, os chamados nativos digitais, talvez desenvolvam vivências que não conseguimos agora imaginar.

Mas, apesar do caráter essencial do contato presencial com o médico, a saúde digital fará uma enorme diferença na questão da democratização do acesso à saúde: pessoas que raramente podem falar com um médico em pessoa o terão de forma virtual à disposição. Os médicos não estarão mais restritos a uma comunidade apenas: seus serviços estarão ao alcance de pacientes que de outra forma talvez jamais pudessem encontrar.

Estamos em um período de transição na saúde, da forma estritamente tradicional e “analógica” praticada desde sempre, para uma digital, que faz uso de tecnologias que há não muito mais de 20 anos pertenciam ao terreno da ficção científica.

A pandemia deu um impulso – mas essa transição já vinha ganhando seu devido espaço. Que esse espaço se torne cada vez mais amplo – para que os brasileiros contem o quanto antes com uma medicina moderna, de qualidade e, principalmente, democratizada.


Claudio L. Lottenberg é mestre e doutor em Oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp), presidente do Instituto Coalizão Saúde e do conselho do Hospital Albert Einstein

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