Essa expressão “não confunda alhos com bugalhos” é um dito popular que expressa a ideia de assuntos desconectados. Pois bem, nesse artigo pretendo mostrar que, em certas circunstâncias, as palavras não guardam apenas certa identidade sonora. Examinando os alhos pode-se inferir muitas coisas interessantes sobre bugalhos. Ou vice-versa.
Vou começar falando de alhos. Em economia costuma-se sinteticamente caracterizar dois tipos de mercados: os denominados price-takers, ou tomadores de preço, e os que, ao contrário, desfrutam de algum poder de monopólio.
Os mercados batizados com a expressão inglesa são assim chamados em razão do fato das empresas que os compõem possuírem limitadíssimas condições para fixar os preços dos itens que comercializam. O outro conjunto abriga exatamente as organizações que fazem o oposto, ou seja, têm liberdade para posicionar seus produtos nos respectivos mercados.
Os mercados tornam-se price takers em função da presença de alguns atributos. O principal é a baixa diferenciação dos produtos comercializados. Por exemplo: quais as diferenças marcantes entre os fabricantes de um televisor de 14 polegadas? Ou ainda, para considerar um serviço: em que se distingue, efetivamente, o serviço de telefonia móvel?
O que ocorre em mercados com esse desenho? O lucro é o resultado do produto do giro das vendas pela margem de lucro. Com a padronização do mercado as margens tendem a encolher. Agora, pode-se perguntar como se dá essa transformação? Realmente, para ficar no exemplo da TV, convido o leitor a comparar um aparelho de TV vendido nas décadas de 50 e 60, com um vendido nas lojas de hoje. Facilmente se verificará que atualmente um televisor, independentemente da marca, é uma estrutura retangular estreita muito parecida com um quadro. Situação muito diferente dos televisores vendidos décadas atrás.
Vou falar agora de bugalhos. Em novembro de 2022 teremos mais uma Copa do Mundo de Futebol. O mundo inteiro acompanhará os jogos exatamente no mesmo momento que a bola estiver rolando nos estádios do Catar. A imagem dessa competição me trouxe o estímulo para examinar com um pouco mais de atenção as Copas anteriores. Considerei todas as Copas desde 1930. Foram até agora 21 copas.
Fiz o seguinte. Tomei todas as partidas e calculei a diferença de gols de cada partida em valor absoluto. Tendo feito isso calculei a média e o desvio padrão (DP) da variável diferença de gols. O que notei?
Tanto a média como o DP da diferença de gols decaem significativamente ao longo desse horizonte de tempo. Para ser mais preciso em 1930 a média da diferença de gols era de 2,8 gols e o desvio padrão 1,4 gols. Em 2018 a referida média caiu para 1,6 gols e o DP para 0,4 gols. É bom assinalar que em 1930 havia apenas 13 seleções e em 2018 32.
Há um outro resultado instigante. A primeira Copa com transmissão pela TV de forma mais ampla foi a de 1970. Considerando esse referencial separei a série em dois períodos: de 1930 a 1970 e de 1970 a 2018. Ou seja: antes da difusão ampla da competição pela televisão e com a presença desse veículo. O que se constata?
Em ambos os períodos, como já assinalado, se nota uma tendência declinante na média da diferença de gols. Isso também se verifica comparando o comportamento do DP nos dois períodos. Entretanto, no primeiro período o DP caiu 36%. No segundo período o decréscimo foi de 56%. Em outras palavras os times foram ficando cada vez mais parecidos e com a transmissão televisiva essas diferenças diminuíram ainda mais rapidamente.
A força subjacente que explica os mercados se aproximarem crescentemente das condições apontadas como estruturas price takers é exatamente a mesma que vem tornando os competidores nas Copas do Mundo mais parecidos uns com os outros: a velocidade das comunicações. Esse aspecto já é determinante e será crescente mais relevante no estabelecimento do posicionamento estratégico das organizações. É um fato tanto para alhos como bugalhos.