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Pandemia reduz o número de mulheres nos negócios

Sebrae revela perda de 1,3 milhão de mulheres empreendedoras de 2019 para 2020. Machismo estrutural é a principal explicação

Mulher empreendedora com homem em meio a um estoque de mercadorias

Do total de empreendedoras atingidas pela pandemia, 75% delas registraram perda de faturamento mensal | Foto: Getty Images

Uma pesquisa do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) mostra que a pandemia de covid-19 reduziu o número de mulheres no empreendedorismo.

De acordo com o levantamento, no terceiro trimestre de 2020 havia cerca de 25,6 milhões de donos de negócio no Brasil. Desse universo, aproximadamente 8,6 milhões eram mulheres (33,6%) e 17 milhões, homens (66,4%).

Em 2019, a presença de mulheres no empreendedorismo correspondia a 34,5%, o que representou perda de 1,3 milhão de mulheres à frente de um negócio entre um ano e outro.

Segundo o Sebrae, a explicação para esse resultado foi a necessidade de as mulheres se dedicarem mais às tarefas domésticas durante a pandemia, um reflexo do machismo estrutural na sociedade.

“Na crise, cuidados com idosos e crianças foram muito mais necessários. Primeiro, porque as crianças estavam fora das escolas e, segundo, os idosos estavam demandando mais cuidados por serem grupo de risco para a covid. Por motivos culturais, essas tarefas sempre recaem muito mais sobre a mulher. O que era precário ficou muito pior”, diz Renata Malheiros, coordenadora nacional do Projeto Sebrae Delas.

Impacto reflete a desigualdade de gênero

Em pesquisa anterior, o Sebrae já havia observado uma perda maior para as mulheres no empreendedorismo do que para os homens.

Do total de empreendedoras atingidas pela pandemia, 75% delas registraram perda de faturamento mensal, enquanto que, para os homens, essa perda foi um pouco menor (71%).

Outro dado que aponta a desigualdade de gênero no ambiente de negócios é que, apesar de as mulheres serem 16% mais escolarizadas do que os homens, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as empresas lideradas por mulheres faturam, em média, menos do que empresas lideradas por homens.

Uma das razões disso é que as mulheres costumam empreender em setores como alimentos, bebidas, moda e beleza, que são segmentos de menor valor agregado na produção e de baixa inovação.

Mulheres no empreendedorismo por necessidade

A maternidade também é um fator que, no Brasil, cria dificuldades para as mulheres se manterem no mercado de trabalho e no mundo dos negócios.

Estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), de 2019, mostrou que metade das mães que trabalham é demitida ou pede demissão até dois anos depois que acaba a licença.

O motivo: a mentalidade de que os cuidados com os filhos são praticamente uma exclusividade delas.

É o caso da empresária Renata Matos Zamperlini, de Campo Grande (MS). Dona de uma loja que vende roupas infanto-juvenis, ela começou vendendo de porta em porta enquanto ainda era executiva em uma empresa privada.

Com o nascimento do filho Davi e a necessidade de dedicar mais tempo em casa, ela abriu mão da carreira profissional e passou a se dedicar integralmente à estruturação de seu negócio.

“Eu queria ter esse horário mais flexível para poder dar conta das demandas de casa também”, explica.

Esse tipo de decisão, motivada por alguma necessidade, é mais comum para as mulheres do que para os homens.

De acordo com Renata Malheiros, do Sebrae, 42% dos empreendimentos das mulheres são por necessidade e não por oportunidade, enquanto que para os homens, esse número é menor (34%).

“O empreendedorismo por necessidade é mais precário, porque normalmente a pessoa não tem alternativa e não se planeja”.

Negócios na pandemia

No caso de Renta Zamperlini, a aposta deu certo e ela prosperou no negócio a partir de 2018, quando chegou a abrir um loja física na capital sul-matogrossense.

Mas veio a pandemia e a empresária acabou pisando no freio, encerrando as atividades presenciais e focando as vendas no delivery. Com o filho de 7 anos o tempo todo dentro de casa, as tarefas se multiplicaram.

“Meu filho Davi foi alfabetizado ao longo de 2020 por meio de aula online, de manhã e à tarde, e eu precisei ficar dando esse suporte, além de cuidar de casa, do almoço, da loja”.

Para a empresária Brunna Campos, de Taboão da Serra (SP), a pandemia também afetou fortemente os negócios no início. Dona de uma empresa de marketing e propaganda em sociedade com o marido, ela temeu que os clientes cortassem os serviços.

“Foi uma fase bem difícil. Passamos os dois primeiros meses achando que teríamos que reduzir equipe, mas no final do ano a gente se recuperou e acabou contratando mais três pessoas”, comemora.

Por não ter filhos, Brunna conta que é mais fácil se dedicar integralmente à vida profissional, mas ela percebe como a sobrecarga de trabalho tem afetado a vida de outras mulheres.

“Uma das minhas colaboradoras, que era representante comercial, tem três filhos, sendo dois pequenos, e com a pandemia ela teve que virar mãe em tempo integral dentro de casa. Não conseguia mais trabalhar nem por telefone”.

Para enfrentar um desafio tão estrutural, segundo Renata Malheiros, é preciso o envolvimento de toda a sociedade.

“Precisamos estimular que os homens discutam essas questões e que as mulheres se articulem em rede para melhorar portfólio, se capacitar e desenvolver novas habilidades. As empresas e instituições também precisam se adaptar, criando brinquedotecas com cuidadores em tudo que é canto”.

Mais digitalizadas e educadas financeiramente

Apesar de identificar a persistente desigualdade de gênero nos negócios, o Sebrae constatou que as mulheres estão mais tecnológicas do que os homens.

76% delas fazem uso das redes sociais, aplicativos ou internet na venda de seus produtos e serviços, enquanto 67% dos homens utilizam esses canais.

Além disso, os homens estão mais endividados do que as mulheres: 38% deles têm dívidas ou empréstimos, mas estão em dia, contra 34% delas.

Já as mulheres são mais cautelosas em relação a contrair dívidas. Segundo o levantamento, 35% delas disseram que não têm dívidas, contra 30% dos homens.

A maior parte dos homens tem também mais empréstimos bancários (46%) do que as mulheres (43%). As dívidas com impostos e taxas foram citadas por 16% dos homens e 13% das mulheres.

A maior parte das mulheres (51%) disse que não buscou empréstimo bancário para a sua empresa desde o começo da crise, enquanto 54% dos homens o fizeram. (Agência Brasil)

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