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Maroni João da Silva

O aço não é pop, mas agora também é soft

Nos dias de hoje, a narrativa sob a perspectiva do fazer humano é uma das principais barreiras entre o sucesso e o fracasso de qualquer negócio e isso se aplica à siderurgia

Fábrica de aço com rolos em destaque

Poucos agentes públicos e privados têm clara percepção sobre a complexidade e essencialidade do aço para as cadeias produtivas a jusante, devido à baixa interação da indústria com diversos stakeholders | Foto: Getty Images

A noção consagrada por japoneses e norte-americanos, desde os primórdios da globalização, de que o protagonismo do social é capaz de fazer toda a diferença no desempenho dos negócios, vem promovendo uma revolução cultural tardia nas práticas relacionais da siderurgia brasileira.

Ao saírem do guarda-chuva estatal, nos anos de 1990, tanto as siderúrgicas brasileiras como as que aqui aportaram, via fusões e aquisições, empreenderam mudanças organizacionais profundas, inspiradas na chamada reestruturação produtiva.

Contudo, a maioria das empresas manteve suas feições culturais hard, ou seja, pouco flexível à comunicação e baixa interação com parte significativa dos stakeholders. Não por acaso, poucos agentes públicos e privados têm clara percepção sobre a complexidade e essencialidade do aço para as cadeias produtivas a jusante.  

Porém, mais recentemente, ferramentas “fora da caixa” vêm alavancando comportamentos, atitudes e ações inspiradas em competências e habilidades multidisciplinares. Em outras palavras, a racionalidade técnica viu-se obrigada a conviver com o empoderamento do lado soft das organizações.   

Essa transição ainda está em curso até porque, face ao seu dinamismo, não existem culturas organizacionais totalmente integradas e consolidadas. Além disso, conflitos e subculturas são recorrentes no ambiente corporativo, pondo em xeque a capacidade das lideranças de construir consensos e transformar diferenças em ganha-ganha, inclusive via inteligência emocional.  

Ainda são poucas as metodologias que facilitam aferir dados quantitativos e qualitativos sobre o impacto positivo da cultura nos negócios. Mas valores visíveis e invisíveis vêm moldando a performance de alguns ícones da produção siderúrgica, como Gerdau, ArcelorMittal, CSN, Usiminas etc., conforme suas mais recentes postagens em redes sociais.

Parte desse panorama se deve à estratégia de potencializar ganhos diversificando o perfil social da força de trabalho via gestão estratégica de RH. Empresas com mais mulheres na liderança, por exemplo, têm 25% mais chances de superar as concorrentes em retorno financeiro.

É o que revela pesquisa McKinsey divulgada em 2020, focalizando 1.000 grandes players de 15 países. O mesmo estudo dá conta de que a diversidade étnica e cultural elevou em 36% a performance econômica das companhias pesquisadas ante 33% apurados em anos anteriores.

A comunicação institucional das usinas também está engajada na mudança cultural da siderurgia que vem sendo abordada. Neste sentido, vem enfatizando a participação do setor e de seus produtos no cotidiano das pessoas, visando ressignificar a percepção desses agentes em relação à siderurgia e aos aços em geral.

Com isso, busca-se de um lado, tornar manifesta a importância dos aços como matéria-prima para outras cadeias produtivas que, sob a ótica de muitos consumidores parece invisível.

De outro, reforçar a imagem da siderurgia como geradora de riquezas, melhorar sua reputação e agregar valor simbólico aos negócios das empresas. Desta forma, constrói-se uma narrativa, segundo à qual, o aço é muito mais que um metal ferroso, cuja produção gera impacto ambiental nem sempre amigável, dependendo da rota tecnológica adotada.

Contudo, é preciso deixar claro que, ao tirar o aço do anonimato, a comunicação tanto das empresas como das entidades representativas do setor, não ignora suas qualidades técnicas de interesse stricto sensu da aplicabilidade.

Sem esse diferencial, seria impossível garantir o ciclo de vida de muitos produtos essenciais, de perfil metálico, para facilitar o dia a dia das pessoas em demandas específicas com como mobilidade, comunicação, moradia etc.

Pelo que se observa, a cultura organizacional das siderúrgicas apropriou-se de um repertório que antes não era factível ao olhar de seus pares. Esses, em sua maioria, costumavam decifrar os elos da cadeia minerometalúrgica sob a perspectiva exclusiva das chamadas hard sciences (física, química, matemática etc.), para alcançar bons resultados.

É claro que o produto em si, ou seja, os aços, continuam valendo mais em função da relação entre propriedades mecânicas (tenacidade, resistência etc.) e seu respectivo desempenho prático. Contudo, essa equação tornou-se mais complexa, pois envolve fatores de outra natureza.   

Por fim, pode-se concluir que o aço não é pop. Mas, sob a perspectiva do fazer humano, também é soft, pois, nos dias de hoje, a cultura é uma das principais barreiras entre o sucesso e o fracasso de qualquer empreendimento.

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@maronisilva é jornalista, escritor, Mestre e Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP, sócio-diretor da Textocon, Comunicação & Cultura Organizacional, autor dos livros Magazine Luiza – Negócio e Cultura e O lado místico do comércio, além de coautor de Gestão de Pessoas no século XXI: Desafios e Tendências para além de modismos.

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