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Ilton Caldeira

Cadeias de suprimentos e a pressão inflacionária nos EUA

Federal Reserve já está afinando os instrumentos contra a inflação para serem utilizados antes do que muitos esperam

Linha de produção de veículos

Com linhas de produção sem peças, preços dos automóveis zero subiram 5,3% em relação ao ano passado nos Estados Unidos | Foto: Getty Images

A alta dos indicadores de inflação tem assustado a população americana. O Consumer Price Index (CPI), principal índice que mede a variação de preços de produtos e serviços, acumulado em 12 meses está em 5,4%, segundo o U.S. Bureau of Labor Statistics.

A última vez que a inflação alcançou patamar tão elevado foi em agosto de 2008. Em agosto daquele ano, a inflação acumulada no período de um ano registrou 5,6%, nas semanas que antecederam a crise financeira e das hipotecas subprime que derrubaram a economia dos Estados Unidos, afetando de diferentes formas os principais blocos comerciais mundo afora.

Mas a pressão atual nos preços tem sido resultado não apenas de um, mas de vários aspectos, incluindo o estrangulamento das cadeias globais de suprimentos. A transição de um cenário severo de pandemia de Covid-19 para um momento mais ameno, graças ao advento das vacinas, pegou diversos setores desprevenidos.

Agora, diversos problemas em cascata estão afetando as empresas ao mesmo tempo. A pandemia forçou muitas indústrias a fecharem temporariamente suas linhas de produção, diminuindo a oferta de diversos produtos. As cadeias de suprimentos foram ainda mais impactadas pela escassez de contêineres e a capacidade limitada de frete aéreo. Agora a falta de semicondutores e plásticos, aliada a um apagão de mão-de-obra têm causado grandes atrasos em todo o sistema.

Como a demanda dos consumidores segue aquecida e a oferta de estoque é limitada, os itens disponíveis acabam desaparecendo rapidamente no varejo. O resultado no curto prazo é uma forte pressão inflacionária. Os dados oficiais até junho deste ano mostram uma alta de 45,1% no preço da gasolina, na comparação com junho de 2020.

Com a escassez global de chips afetando a velocidade que os americanos podem tirar um carro novo da loja, os preços dos automóveis zero subiram 5,3% em relação ao ano passado. Como achar um carro novo para comprar virou algo raro, o mercado de usados está aproveitando a onda. Os preços dos carros usados subiram 10,5% em junho, o maior avanço em um mês em 70 anos, e impressionantes 45,2% em 12 meses.

Alguns vendedores já estão ficando preocupados com a possibilidade de não terem mercadorias suficientes para a temporada de compras de fim de ano, um período crucial para o setor. Os varejistas normalmente começam a planejar e solicitar encomendas em abril, para estarem com os estoques abastecidos até outubro.

Diante da preocupação de que esses gargalos possam durar vários meses, ou até mesmo prosseguir em 2022, a National Retail Federation (NRF), organização centenária que representa mais de 16 mil comerciantes e varejistas de diversos portes, enviou carta ao presidente americano Joe Biden cobrando medidas para estancar os problemas logísticos e de oferta de produtos que poderiam impactar negativamente a recém-iniciada recuperação da economia americana.

Na esteira da disparada de preços e todos os desdobramentos recentes nos Estados Unidos, Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed), o banco central americano, afirmou em 15 de julho, durante audiência semestral no Congresso, que a inflação “não está moderadamente acima de 2%, está bem acima”. Powell mencionou ainda o desconforto dos membros do Fed e o desafio atual de “reagir à inflação mais alta do que o esperado”.

Não está ainda visível no horizonte o momento em que o Fed colocaria seu arsenal em ação para trazer a inflação a níveis mais moderados. Mas após a fala de Powell no Congresso, pode ser que o banco central já esteja afinando os instrumentos para serem utilizados muito antes do que o esperado.


Ilton Caldeira é jornalista de Economia e Política e especialista em Relações Internacionais pela FGV-SP. Nos Estados Unidos é Head de Comunicação da Dell’Ome Law Firm e sócio da consultoria Smart Planning Advisers.

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