close
Sidney Klajner

Sidney Klajner

Pesquisa é investimento sim!

A extraordinária façanha da criação das vacinas contra a Covid-19 em tempo tão curto é um bom exemplo de que a ciência pode agir rápido, mas nunca da noite para o dia

Pesquisadores em laboratório

Exemplo de instituição filantrópica que investe em pesquisas, Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa teve 883 publicações em revistas científicas indexadas em 2020 | Foto: Getty Images

Imagine se as vacinas contra a Covid-19 até agora não tivessem sido desenvolvidas. Melhor nem pensar o que estaríamos passando caso o Sars-CoV-2 continuasse seu avanço sem nada para contê-lo. Felizmente, a ciência agiu com uma rapidez impressionante. O genoma do vírus foi decodificado em janeiro de 2020, quando a pandemia estava circunscrita à China. Em menos de doze meses, as vacinas Pfizer/BioNTech e Oxford/AstraZeneca estavam aprovadas e prontas para uso.

A agilidade surpreendeu muita gente, mas o fato é que quando surgiu novamente o desafio de criar uma vacina com urgência, desta vez a ciência estava preparada. Três fatores foram decisivos: décadas de pesquisa sobre o coronavírus e sobre imunizantes, celeridade das agências regulatórias e o apoio financeiro de organizações públicas e filantrópicas. Sem eles, o mundo não teria testemunhado o mais rápido processo de criação de vacina da história.

Há lições exemplares a serem tiradas pelo Brasil desse marco. Investir em ciência de forma sistemática é a óbvia. Fala-se aqui de apoiar estudos nas diversas áreas do conhecimento, contemplando a interdisciplinaridade necessária à excelência do pensamento científico. O que não é tão explícito assim é a importância do engajamento de instituições filantrópicas ou não à causa da ciência.

No caso da Covid-19, foram os bilhões de dólares fornecidos por instituições públicas – só o governo americano destinou US$ 10 bilhões às empresas farmacêuticas – somados a importâncias de grandeza similar que possibilitaram uma forma inédita de desenvolvimento de imunizantes: a realização concomitante dos testes em laboratório e dos clínicos. Foi apenas com o suporte financeiro assegurado por Estados e as companhias que as farmacêuticas assumiram o risco financeiro de apostar em opções que podiam dar em nada.

Aqui, temos um caminho a percorrer nesse sentido. Poucos são os exemplos de instituições filantrópicas que investem em pesquisa científica, seja ela básica ou aplicada. Na Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, produzir e compartilhar conhecimento fazem parte de nossa missão. Para se ter ideia, o Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa teve 883 publicações em revistas científicas indexadas em 2020, sendo a maioria de alto impacto e as mais respeitadas do mundo pelo rigor com que selecionam os estudos a serem divulgados.

No ano passado, o foco foi Covid-19. O Einstein recebeu a liberação do Conselho Nacional de Ética (Conep) para realizar 157 projetos de estudos relacionados a vários aspectos da doença. Entre eles, eficácia de medicamentos e novos métodos diagnósticos. Desses, 41 foram encerrados em 2020. Os demais continuam em andamento.

O instituto funciona sustentado em um modelo contemporâneo que prevê, por exemplo, a execução de pesquisas translacionais e colaborativas. O Einstein também foi a primeira organização de saúde filantrópica brasileira a criar uma área destinada à preparação, aprovação e condução de ensaios clínicos (Academic Research Organization, ARO) realizados sob encomenda. A excelência Einstein assegura a qualidade dos estudos, feitos para comprovação de segurança e eficácia de novas terapias (medicamentos e tratamentos). Há 25 ensaios em andamento, solicitados por 15 clientes. Algumas pesquisas foram publicadas em periódicos científicos renomados. A mais recente investigou o impacto de um anti-inflamatório para conter a tempestade inflamatória que pode ocorrer em pacientes com Covid-19. A conclusão foi divulgada na edição do dia 16 de junho de 2021 do The New England Journal of Medicine.

Porém, o Brasil precisa avançar mais no campo da pesquisa. Não só porque o saber tem valor por si, mas também por ser a base do desenvolvimento social e econômico dos países. Nenhuma nação desenvolvida enfrenta deficiências tão agudas na área da ciência quanto as que se encontram em desenvolvimento. Trata-se de uma escolha que deve ser feita agora, nesse momento em que está evidente a importância do estímulo contínuo à produção de conhecimento. Como lembrou a imunologista Akiko Iwasaki, professora da Yale University (EUA), em artigo publicado na Nature Medicine, as soluções não aparecem em um estalo de dedos.

“As pesquisas sobre vacinas baseadas em DNA começaram há pelo menos 25 anos”, escreveu. “As que atuam sobre RNA, há cerca de 15 anos.” A pesquisadora alerta que a humanidade não teria hoje os imunizantes se lá atrás instituições públicas e filantrópicas tivessem subestimado a importância de estudos na área. “Nenhuma quantidade de dinheiro ajudaria no momento atual se não tivéssemos um sólido conhecimento obtido ao longo de anos. A extraordinária façanha da criação das vacinas contra a Covid-19 em tempo tão curto é um bom exemplo de que a ciência pode fazer coisas rapidamente, mas nunca da noite para o dia.”


Sidney Klajner é Cirurgião do Aparelho Digestivo e Presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein. Possui graduação, residência e mestrado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, além de ser fellow of American College of Surgeons. É coordenador da pós-graduação em Coloproctologia e professor do MBA Executivo em Gestão de Saúde no Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa do Einstein.

Assine o Safra Report, nossa newsletter mensal

Receba gratuitamente em seu email as informações mais relevantes para ajudar a construir seu patrimônio

Invista com os especialistas do Safra