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Maroni João da Silva

Como remover muros simbólicos na volta aos escritórios

Como enfrentar o desafio de alavancar o aprendizado do home office para alavancar a interação inovadora na forma híbrida de trabalho

Voluntários

A solidariedade doadora representa uma excelente ferramenta de acesso a competências comportamentais, capazes de habilitar funcionários a lidar com situações-limite | Foto: Getty Images

Com a volta gradual das empresas aos escritórios, espera-se um golaço dos gestores de RH diante do enfrentamento de um desafio inadiável: como utilizar o aprendizado do home office para a alavancagem de processos de interação inovadores e alinhados com a forma híbrida de trabalho. A receita é crucial tanto para garantir o equilíbrio do clima organizacional como os ganhos de produtividade do trabalho no cenário pós-Covid-19. Mas, por hora, a bola ainda está rolando em campo, à espera de um chute certeiro, sob a inspiração do time da casa ou de alguém de fora das empresas.   

Costumeiramente, esse mercado é tentado por soluções milagrosas que, às vezes, se constituem em verdadeiras caixas-pretas. Muitas delas são importadas ou disponibilizadas por gurus iniciados em modismos sobre gestão, respaldados por best-sellers focalizando cultura de negócio. Mas é bom que as empresas fiquem alertas sobre esse risco, pois o remédio que funciona bem em uma determinada empresa pode não gerar o mesmo efeito em outra, haja visto que cada companhia tem suas peculiaridades, principalmente em relação à cultura organizacional.

Contudo, qualquer empresa pode encurtar caminhos, seguindo atalhos que conduzam de forma segura e assertiva a um modelo flexível de gestão de pessoas no novo normal. Sugerimos, por exemplo, que ao enfrentar o desafio referido no início deste artigo, a empresa busque inspiração em suas melhores práticas de responsabilidade social, a começar por ações de assistência social focadas no trabalho voluntário de funcionários.  

Por experiência, sabemos que, quando bem administrada, a solidariedade doadora representa uma excelente ferramenta de acesso a competências comportamentais, capazes de habilitar funcionários a lidar com situações-limite, tal qual muitas empresas estão vivenciando, inclusive desde antes da pandemia. Uma das provas encontra-se em iniciativas filantrópicas bem-sucedidas, protagonizadas por funcionários de uma grande empresa de comércio, conforme relato no meu último livro “O lado místico do comércio”, publicado, em outubro de 2020, cujas versões impressas e online estão à venda na Appris Editora e Amazon, entre outras distribuidoras.

A publicação revela uma sacada extraordinária de três renomadas empresas comerciais do Brasil, que em 2014 faturavam R$ 58 bilhões, empregavam 110 mil pessoas e estavam empenhadas em se destacarem dentre os concorrentes. Ou seja, como o forte do varejo é a prestação de serviços representada pela venda, que é uma variável comum a todas as lojas, as empresas em questão decidiram se reposicionar no mercado de consumo por meio de um diferencial competitivo, inspirado no potencial das pessoas e em boas práticas de relacionamento.   

A inovação baseou-se, em primeiro lugar, em uma mudança do eixo de abordagem da venda, deslocando o foco do produto para o cliente. Em segundo, a gestão de Recursos Humanos foi transformada em uma instância hierárquica de poder estratégico a fim de garantir a eficácia dessa nova pegada de marketing, cujo xeque-mate fica por conta da criatividade e da empatia do vendedor no seu contato cara a cara e constante com o cliente.

Para alcançar esses objetivos, as três empresas desenvolveram técnicas de treinamento inéditas e implementadas, cada uma do seu jeito e via cultura organizacional, contemplando certas crenças e valores cultuados por funcionários. Essa mistura de religião, negócio e capacitação acabou fortalecendo e disseminando ainda mais, no interior das empresas, um tipo de empreendedorismo que leva os funcionários a “vestirem a camisa da empresa”, com fé e determinação. Além disso, são motivados a darem o melhor de si para tonar realidade seus sonhos e os das empresas, inspirados na narrativa de que patrões e empregados atuam no mesmo time, logo a vitória destaca-se como um bem comum.    

Pelo que observei e analisei, em uma das empresas pesquisadas o voluntário é ponta de lança nesse jogo interacionista, atuando como uma via de mão dupla para reforçar o ganha-ganha, dentro e fora da companhia. Isso porque, além de melhorar a imagem e a reputação da empresa, ao representá-la publicamente através de atividades filantrópicas corporativas – muitas inspiradas em um misto de religiosidade e cidadania –, ele difunde comercialmente a marca da companhia e traz para seu ambiente de trabalho um aprendizado sociocultural com forte poder multiplicador.

Em outras palavras, ao se sentir de alma lavada e com a autoestima renovada por fazer o bem, o voluntário pode ser também habilitado a promover consensos e boas práticas relacionais. Desta forma, ele facilita decisivamente o compartilhamento de novas ideias, tolerância com a diversidade e apaziguamento do clima organizacional, condição essencial para a satisfação profissional e melhoria da produtividade do trabalho.


@maronisilva é jornalista, escritor, Mestre e Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP, sócio-diretor da Textocon, Comunicação & Cultura Organizacional, autor dos livros Magazine Luiza – Negócio e Cultura e O lado místico do comércio, além de coautor de Gestão de Pessoas no século XXI: Desafios e Tendências para além de modismos.

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