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Claudio L. Lottenberg

A tecnologia a serviço do envelhecimento saudável

Estudo mostra benefícios dos jogos digitais para estabilizar doenças como o Alzheimer

Alzheimer

Manter a mente ativa é a forma de se prevenir a demência – e a doença de Alzheimer é a forma mais comum dessa condição | Foto: Getty Images

O universo dos jogos digitais é cercado de controvérsias. Há os que apontam o excesso de violência em jogos com temas de guerra e violência urbana, para citar apenas alguns tipos. Também não faltam opiniões que apontam certa influência deletéria dos jogos digitais sobre os jovens, prejudicando atenção e aprendizado. Além de discussões de cunho moral, sobre como tais jogos afetariam valores – e a cada ciclo de avanço da tecnologia digital, com o realismo sempre maior de tais jogos, mais as críticas se exacerbam. Mas embora tais jogos tenham por finalidade primeira o entretenimento, ela não é a única. Na saúde, por exemplo, já se faz aplicação deles.

Um estudo, conduzido pela pesquisadora brasileira Ana Cláudia Bonilha e defendida como tese de doutorado na Unifesp, mostrou que a alfabetização digital de idosos – incluindo aí o uso de jogos digitais – pode ajudar a estabilizar condições de declínio cognitivo, como a doença de Alzheimer. Foi um trabalho conduzido por quatro meses, envolvendo 62 pessoas acima de 60 anos e que participaram voluntariamente. Esse grupo foi dividido em dois, e naquele que foi submetido a sessões de uso de computador verificou-se melhora de atenção e orientação espacial. O estudo deve prosseguir envolvendo jogos de smartphone – e detalhe de não pouca relevância: não fez uso de medicamentos.

Tornou-se de certa forma lugar comum apontar que estamos em meio a uma revolução digital, que, para efeitos práticos, teve início com a chegada da internet – e que, assim, já estamos há quase um quarto de século vivendo seus desdobramentos, que avançam em ritmo acelerado. Mas um detalhe é que, mesmo com o que já se viu até aqui, estamos apenas no princípio desse processo. Recursos de realidade virtual tornam os jogos digitais ambientes em que os jogadores ficam cada vez mais imersos na “realidade” digital, proporcionando experiências sem paralelo. Há ainda a chamada realidade aumentada – uma ferramenta já usada até no comércio, para simular, com nossos celulares, a presença de objetos ao nosso redor. E o metaverso, que está ainda mais em seus primeiros passos. A “fusão”, por assim dizer, do nosso dia a dia com o meio digital vai se tornando cada vez mais intensa.

Essa tecnologia digital vai encontrar aplicações de que hoje nem fazemos ideia. O uso de dinheiro, por exemplo, já parece uma prática arcaica, uma vez que transferências e pagamentos podem ser efetuados de forma digital cada vez mais eficientes e rápidas. Na medicina, a saúde digital vai se tornando cada vez mais o ambiente em que tanto o setor público como o privado vão operar, sem espaço para voltar ao modo como as coisas se davam antes.

No caso da aplicação dos jogos digitais – e da alfabetização digital – no tratamento de quem tem Alzheimer, abre-se um campo imenso para beneficiar pessoas que sofrem desse mal. A OMS (Organização Mundial da Saúde) destaca que até 2030, cerca de 78 milhões de pessoas podem vir a ser afetadas pela demência. O órgão também chamou a atenção, no início de outubro, para o fato de que faltam recursos para pesquisas científicas sobre demência – o volume para estudar essa condição corresponde a cerca de 1,5% de toda a produção científica na área de saúde. É preciso avançar.
Manter a mente ativa é a forma de se prevenir a demência – e a doença de Alzheimer é a forma mais comum dessa condição. Há formas menos digitais, por assim dizer, de se tratar de quem tem a doença: uma outra pesquisa (das universidade Columbia e Duke, ambas nos EUA, e publicada pelo New England Journal of Medicine – Evidence) mostrou que fazer palavras cruzadas pode ser até mais benéfico que os jogos digitais, no caso de comprometimento cognitivo leve.

Mas os meios digitais tendem a se tornar mais presentes, e o quanto mais se puder integrar os idosos a este universo, maiores serão os benefícios em diversas outras áreas da vida deles. Importante é que se siga buscando novas formas de tratar e prevenir a demência. Mais que nunca vivemos em um tempo em que o aprendizado será constante e necessário – e em que tanto ainda haverá por se aprender. Como escreveu o imperador romano Marco Aurélio: “Você tem poder sobre a sua mente, não sobre fatos externos. Compreenda isso, e você encontrará a força de que precisa”.

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Claudio L. Lottenberg é mestre e doutor em Oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp), presidente do Instituto Coalizão Saúde e do conselho do Hospital Albert Einstein

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