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Guerra dos chips envolve as empresas de tecnologia mais importantes do mundo

Uma das disputas comerciais mais importantes da atualidade envolve as mais importantes indústrias de componentes eletrônicos do planeta

Guerra dos chips

Na semana passada, o segmento de chips sofreu perdas generalizadas após a Reuters reportar que a fabricante de chips taiwanesa TSMC está preocupada com a demanda | Foto: Getty Images

Os Estados Unidos decidiram dar prioridade à estratégia de fortalecer a cadeia de suprimentos de semicondutores, após o efeito inflacionário da pandemia de covid provocado pela falta de componentes eletrônicos. A estratégia já vem sendo chamada de ‘guerra dos chips’, pelo potencial estrago que esses micro-componentes eletrônicos podem causar na indústria do ocidente.

Praticamente toda a fabricação dos chips sofisticados está concentrada no leste da Ásia, alertou a secretaria do Tesouro americano, Janet Yellen, durante a recente visita ao Vietnã. Segundo ela, a experiência da pandemia indica o risco da interrupção dessa cadeia de suprimentos. A escassez de chips durante a pandemia contribuiu para perdas de receita mundial de mais de US$ 500 bilhões de 2020 a 2022, segundo ela.

A secretária garantiu que os EUA estão trabalhando junto a países parceiros para aumentar os investimentos na produção de semicondutores. A dependência da importação de chips asiáticos se reflete nos negócios das empresas americanas de tecnologia. Na semana passada, o segmento de chips em especial teve perdas generalizadas após a Reuters reportar que a fabricante de chips taiwanesa TSMC está preocupada com a demanda. O papel da Nvidia caiu 3,69%, o da Advanced Micro Devices (AMD) perdeu 4,82%, o da Applied Materials recuou 4,37% e o da ASML cedeu 4,06% na sexta-feira.

A TSMC é a sigla da Taiwan Semiconductor Manufacturing Company, multinacional taiwanesa de contratos de fabricação de semicondutores. É uma das maiores empresas de Taiwan, a mais valiosa companhia de semicondutores e a maior fábrica independente de semicondutores do mundo. É a primeira fabrica a produzir chips de 7 e 5 nanômetros, posteriormente aplicados no microprocessador Apple A14, o primeiro a comercializar a tecnologia de litografia Extreme Ultraviolet (EUV) em grandes volumes. Em 2022, foi considerada uma das maiores empresas de tecnologia do mundo.

Os esforços dos Estados Unidos de restringir o acesso da China à tecnologia de chips parecem ter sofrido um golpe: o mais recente smartphone da Huawei contém um dos chips mais avançados já produzidos por fabricantes nacionais da China.

Smartphone Mate 60 Pro da Huawei possui processador de sete nanômetros | Foto: Getty Images

O smartphone Mate 60 Pro da Huawei possui processador de sete nanômetros, de acordo com análise realizada pela empresa de pesquisa TechInsights. A empresa disse que o chip é responsabilidade da maior fabricante de chips da China, a Semiconductor Manufacturing International.

Embora o processador ainda esteja atrás dos semicondutores de ponta da Taiwan Semiconductor Manufacturing e da Intel, é a capacidade de fabricação de chips chinesa mais avançada que a TechInsights documentou até agora.

Uma questão importante é se o chip de sete nanômetros foi produzido depois que as sanções dos EUA impediram empresas como a Taiwan Semiconductor de exportar chips avançados para a China e proibiram empresas como a ASML Holding de vender as mais recentes máquinas de “litografia” para fabricação de semicondutores para empresas chinesas.

Guerra dos chips: China apela para que Japão não interrompa fornecimento

O governo da China pediu recentemente ao Japão para não interromper a indústria de semicondutores, depois que as restrições às exportações de tecnologia japonesa de fabricação de chips entraram em vigor, aumentando as restrições tecnológicas que Washington e seus aliados impuseram a Pequim por motivos de segurança.

As restrições japonesas limitam o acesso chinês a ferramentas para gravar circuitos microscopicamente pequenos em chips avançados para smartphones, inteligência artificial e outros aplicativos. A Holanda também se juntou aos Estados Unidos para limitar o acesso a ferramentas de fabricação de chips que, segundo Washington, poderiam ser usados para desenvolver armas.

“Estamos profundamente insatisfeitos e lamentamos o ato”, disse a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores Mao Ning. Ela pediu para o Japão “impedir que medidas relevantes interfiram na cooperação normal da indústria de semicondutores entre os dois países”.

O Partido Comunista investiu bilhões de dólares na construção de fundições de chips chinesas, mas precisa de tecnologia ocidental e japonesa para produzir os chips mais avançados. Isso ameaça atrasar os esforços de Pequim para desenvolver indústrias de tecnologia.

A maior empresa de tecnologia da China, a Huawei, ganhou destaque global como líder em redes sem fio 5G e smartphones antes de se dedicar ao desenvolvimento de chips e inteligência artificial (IA). Mas em 2019, a empresa se tornou um alvo dos EUA quando o governo Trump a colocou em uma lista de companhias proibidas de atuar no país — o ex-presidente também pressionou os seus aliados a banir os equipamentos da Huawei por completo devido a preocupações com espionagem.

As sanções quase acabaram com o negócio de celulares para consumidores da Huawei. Mas a empresa se recuperou com o apoio do governo da China. Agora, a gigante de tecnologia ressurge com um aparelho celular que tem preocupado o ocidente por conter um chip potente fabricado inteiramente na China, o que pode tornar o país independente na produção de semicondutores.

A campanha contra a Huawei — e seu possível retorno — levantam questões sobre uma guerra já antiga entre os dois territórios. Autoridades do governo dos EUA dizem que a Huawei poderia usar sua presença nas redes de telecomunicações do mundo para fazer espionagens. Em 2012, um relatório do Comitê de Inteligência da Câmara dos EUA apontou a Huawei e a ZTE, outra fabricante chinesa de equipamentos de comunicação, como possíveis ameaças à segurança. Em 2020, a Comissão Federal de Comunicações designou as empresas como perigosas e ordenou que as operadoras dos EUA retirassem os equipamentos da Huawei e da ZTE de suas redes.

Antes disso, já em 2018, as preocupações com a Huawei levaram o então presidente Donald Trump a bloquear uma aquisição que poderia ter entregue a liderança global à empresa chinesa. Essas preocupações aumentaram à medida que as operadoras gastaram bilhões de dólares em redes 5G, que coletam dados e permitem serviços em uma escala sem precedentes.

Huawei tornou-se em três décadas uma das maiores empresas do mundo

Em pouco mais de três décadas, a Huawei deixou de ser uma revendedora de produtos eletrônicos para se tornar uma das maiores empresas privadas do mundo, com posições de liderança em equipamentos de telecomunicações, celulares, computação em nuvem e segurança cibernética. Com isso, a chinesa conseguiu ter operações substanciais na Ásia, Europa e África, mas sanções dos EUA prejudicaram seus negócios.

A empresa continuou a investir em 5G, entrando entre os 10 maiores recebedores de patentes dos EUA em 2019, e ajudou a construir redes 5G em todo o mundo.

As sanções assustaram alguns clientes e fornecedores da Huawei em todo o mundo, mas os consumidores e as operadoras chinesas se uniram a ela. A empresa é um dos maiores investidores do país em pesquisa e desenvolvimento.

Em agosto de 2023, um exame de seu mais recente smartphone Mate 60 Pro revelou um chip de 7 nanômetros projetado pela companhia que está apenas alguns anos atrás da tecnologia mais avançada do mundo. Também foi dito que a Huawei estava estabelecendo uma rede de fábricas para fabricar seus chips depois que as sanções bloquearam seu acesso a muitas instalações avançadas.

O governo dos EUA — assim como o chinês e outros — tem receio de empregar tecnologia estrangeira em comunicações vitais por medo de que os fabricantes possam instalar “escutas” ocultas para que espiões acessem dados confidenciais ou que as próprias empresas os entreguem aos governos de seus países.

As redes 5G são particularmente preocupantes porque vão além de tornar os downloads de smartphones mais rápidos. Elas também permitem novas tecnologias, como carros autônomos e a internet das coisas. A operadora Vodafone, sediada no Reino Unido, teria encontrado e corrigido algumas falhas de escutas em equipamentos da Huawei usados em seus negócios na Itália em 2011 e 2012. Embora seja difícil saber se essas vulnerabilidades foram mal-intencionadas ou acidentais, a revelação foi um golpe para a reputação da Huawei.

O Japão e a Austrália aderiram ao boicote dos EUA logo no início, enquanto o Canadá proibiu a Huawei de usar 5G em 2022, depois de hesitar por mais de três anos. O Reino Unido proibiu suas operadoras de telecomunicações de comprar equipamentos 5G da Huawei a partir de 2021, e os equipamentos já instalados devem ser removidos até 2027. A Suécia baniu a Huawei e a ZTE de sua rede 5G em 2020.

Embora a Alemanha tenha evitado uma proibição total, suas operadoras decidiram não usar a Huawei no núcleo crítico de suas redes 5G. Mas a empresa conquistou clientes na Rússia, no Oriente Médio, na África e na Ásia, incluindo as Filipinas e a Tailândia.

Sob o comando do presidente Joe Biden, as condições de algumas licenças de exportação foram reforçadas em componentes como semicondutores, antenas e baterias, impedindo seu uso em dispositivos 5G da Huawei. Outras medidas anteriores incluíram a adição de 38 afiliadas da Huawei em 21 países na lista de proibição americana. A Comissão Federal de Comunicações disse que estabeleceria uma relação de equipamentos proibidos no mercado interno e criaria um programa para reembolsar as operadoras dos EUA pela implementação da ordem.

Cisco processou a Huawei por infringir patentes

Em 2003, a Cisco processou a Huawei por supostamente infringir suas patentes e copiar ilegalmente o código-fonte usado em roteadores e switches. A Huawei removeu o código, os manuais e as interfaces de linha de comando contestados e o processo foi arquivado. A Motorola processou a Huawei em 2010 por supostamente conspirar com ex-funcionários para roubar segredos comerciais. Esse processo foi posteriormente resolvido.

Em 2017, um júri considerou a Huawei responsável pelo roubo de tecnologia robótica da T-Mobile e, em janeiro de 2019, o Departamento de Justiça dos EUA indiciou a Huawei por roubo de segredos comerciais relacionados a esse caso. No mesmo mês, a Polônia, um firme aliado dos EUA, prendeu um funcionário da Huawei por suspeita de espionagem para o governo chinês. A Huawei demitiu o funcionário e negou qualquer envolvimento em suas supostas ações.

A Huawei diz que as restrições dos EUA não têm a ver com segurança cibernética, mas são projetadas para proteger o domínio americano na tecnologia global. A empresa negou repetidamente que ajude o governo de Pequim a espionar outros governos ou empresas. A companhia, de propriedade do fundador Ren Zhengfei, bem como de seus funcionários por meio de um sindicato, começou a divulgar resultados financeiros, gastou mais em marketing e se envolveu com a mídia estrangeira. Ren tornou-se mais franco ao lutar para defender sua empresa.

Embora tenha dito que se orgulhava de sua carreira militar e de sua filiação ao Partido Comunista, ele rejeitou as sugestões de que estava cumprindo as ordens de governo ou de que a Huawei havia entregue informações de clientes. As conquistas tecnológicas por trás do Mate 60 Pro acenderam o fervor nacionalista em toda a China e ele se tornou um símbolo da luta do país contra as sanções dos EUA. A mídia apoiada pelo Estado, incluindo o jornal Global Times, declarou que o surgimento do chip que equipa o smartphone é um avanço diante das restrições americanas.

No final de 2020, o Pentágono adicionou mais quatro companhias, incluindo a China National Offshore Oil e a SMIC, a uma lista de empresas que, segundo ele, pertencem ou são controladas pelos militares da China, expondo-as a um maior escrutínio e possíveis sanções. Outros gigantes chineses da tecnologia foram incluídos na lista de proibições por supostamente estarem envolvidos em violações de direitos humanos contra a minoria muçulmana na região de Xinjiang.

Entre elas estão a Hangzhou Hikvision Digital Technology e a Zhejiang Dahua Technology, que, segundo alguns relatos, controlam até um terço do mercado global de vigilância por vídeo, a SenseTime, startup de inteligência artificial mais valiosa do mundo, e a Megvii Technology, também gigante da IA. A ZTE quase entrou em colapso depois que o Departamento de Comércio dos EUA a proibiu por três meses em 2018 de comprar tecnologia americana. Os EUA adicionaram a Pengxinwei IC Manufacturing, mais conhecida como PXW, à sua lista em 2022. (Com informações da AE)

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