O número de diabéticos tem crescido no mundo todo, associado principalmente ao aumento da obesidade. O Brasil é o sexto país (já foi o quinto) com mais portadores adultos da doença: 15,73 milhões de pessoas na faixa dos 20 aos 70 anos*. Um dado que torna esse quadro ainda mais grave diz respeito ao tratamento: menos de 10% dos indivíduos com diabetes tipo 1** e cerca de 29% do tipo 2** têm hemoglobina glicada (nível de açúcar no sangue) no patamar alvo, que é 7%.
Novas tecnologias em dispositivos e medicamentos já disponíveis e outras que chegarão em breve congregam diferenciais importantes para ajudar no controle da doença e facilitar a rotina de cuidados dos pacientes. Com o apoio do Dr. João Roberto de Sá – endocrinologista do Einstein e coordenador do Departamento de Doença Renal da Sociedade Brasileira de Diabetes –, preparamos uma lista das principais novidades e recursos:
- Bomba de infusão de insulina de alça fechada, inovação que o Dr. João Roberto classifica como o “estado da arte” – É um aparelho de insulina menor que um celular que tem um sensor que mede a glicose intersticial (glicose do fluido intersticial embaixo da pele, diferente da glicemia da ponta-de-dedo, que mede a quantidade de glicose no sangue) e, automaticamente, injeta a quantidade adequada para a necessidade do paciente. Com isso, o indivíduo se mantém muito tempo no alvo glicêmico, reduzindo a chance de hipoglicemia. O dispositivo é indicado para diabetes tipo 1 e alguns casos de tipo 2.
- Canetas inteligentes de insulina – Esses dispositivos, que devem chegar em breve ao Brasil, registram automaticamente doses, data e horário das aplicações, facilitando o gerenciamento do dia a dia do paciente. Os dados são enviados por um aplicativo para o celular ou banco de dados, com um histórico do controle. Alguns emitem alerta para lembrar o horário e dosagem da aplicação.
- Evolução das insulinas – O tratamento moderno de múltiplas doses é o basal-bolus. É usada uma insulina basal lenta, semilenta ou ultralenta (lenta e semilenta de 2 a 3 vezes ao dia, ultralenta apenas 1 vez ao dia) associada ao bolus, uma insulina ultrarrápida aplicada antes das refeições. Outra novidade que deve checar logo ao Brasil é uma insulina de ação ultralonga, para uma única aplicação semanal. Inicialmente, está sendo indicada para o diabetes tipo 2. Os estudos que avaliam sua segurança para pacientes com diabetes tipo 1 ainda estão em andamento.
- Agonistas do receptor GLP1 – São várias classes de medicamentos, como semaglutida, dulaglutida e a liraglutida, que ajudam a controlar os níveis de glicose no sangue e sinalizam ao cérebro a sensação de saciedade. Isso porque simulam os efeitos do GLP-1, um hormônio natural que é produzido no intestino. Dessa forma, proporcionam o tratamento do diabetes associado à perda de peso e se mostraram também protetores cardíacos e renais. Diabéticos têm de 2 a 4 vezes mais risco de ter um problema cardiovascular (como infarto e AVC) e de 20% a 40% mais risco de ter algum grau de doença renal. Existem ainda os inibidores do SLGT2, que evitam a reabsorção da glicose pelo rim e favorecem a eliminação do açúcar pela urina. Na área de medicamentos, uma novidade que deve chegar ao Brasil no ano que vem é a tirzepatida, que atua em dois receptores, o GLP-1 e o GIP.
- Adesivos (patch) de insulina – por enquanto são promessas, mas há estudos de produtos desse tipo em andamento. São adesivos colocados na pele que, a partir de enzimas que interagem com o nível de glicose no tecido subcutâneo, liberam a quantidade de insulina de acordo com a necessidade do indivíduo.
- Sensores de glicose – São dispositivos para o monitoramento da glicemia intersticial. Um deles é um sensor (tipo de botão, geralmente colocado no braço) acoplado a um transmissor que capta os valores da glicose a cada 5 minutos, e as informações são passadas por rede sem fio para um leitor portátil. Outro modelo é um sistema de monitoramento em que o sensor se comunica direto com a bomba de insulina.
- Transplante de pâncreas – É realizado apenas em casos muito graves de pacientes com diabetes tipo 1. O procedimento leva ao completo controle da insulinodependência e a mortalidade é baixa, porém, exige que o paciente tome imunossupressores e há sempre o risco de rejeição do pâncreas transplantado.
- Terapia com células-tronco – Ainda está em fase de estudos, mas há uma grande esperança em torno dessa terapia que usa células-tronco para que se transformem em células produtoras de insulina (células beta). É uma fronteira promissora para o tratamento do diabetes tipo 1.
- Cirurgia metabólica – É indicada em casos de grande dificuldade de controle do diabetes associado a algum grau de obesidade. São principalmente pacientes com diabetes tipo 2. Indivíduos diabéticos com Índice de Massa Corpórea (IMC) a partir de 30, que não teriam indicação para a cirurgia bariátrica, podem se beneficiar muito da cirurgia metabólica. Embora não se possa falar em cura, estudos mostram remissão da doença por longos períodos. O benefício é um pouco menor em pacientes com diabetes mais grave por muito tempo. Um dado curioso é que, nesses casos, ao contrário do que se imagina, a indicação é a técnica sleeve, que remove apenas uma parte do estômago e é menos complexa que a by pass (Y de Roux), já que a relação benefício x risco é menor.
Dos novos recursos de tratamento e controle da doença aos dispositivos que facilitam a vida dos pacientes, são todos avanços muito bem-vindos. Mas, ante as estimativas da OMS de que os casos de diabetes continuarão crescendo, boa parte deles associados ao aumento da obesidade, este é um problema que merece atenção. A International Diabetes Federation (IDF) calcula que o Brasil terá 21,5 milhões de diabéticos em 2030. Um importante caminho a seguir para evitar estar entre eles é manter o peso sob controle, com dieta equilibrada e atividade física regular, e procurar ajuda médica quando os quilos na balança estiverem pesando demais.
*Dados do Atlas do Diabetes 2021 da Federação Internacional de Diabetes (IDF)
**O diabetes tipo 1 é causado pela baixa ou nenhuma produção de insulina pelo pâncreas. Ele não pode ser prevenido, pois é uma condição do sistema imunológico que ataca as células do pâncreas que produzem a insulina. O tipo 2 é caracterizado por uma resistência do organismo à ação da insulina. É mais comum a partir dos 40 anos e está fortemente relacionada com obesidade, maus hábitos alimentares e sedentarismo.