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Depressão não é tristeza. Veja como identificar

O diagnóstico da doença ficou mais difícil diante das perdas, do medo e do desânimo trazidos pela pandemia de covid-19

Depressão não pode ser confundida com tristeza

A persistência de sintomas como falta de concentração e prazer na convivência são sinais de alerta para o problema | Foto: Getty Images

A depressão nunca foi um problema simples de diagnosticar. Com a pandemia, a detecção da doença ficou mais difícil: como separar o medo da doença e o desânimo diante das notícias, além de perdas, de um quadro depressivo?

Daniel Costa, psiquiatra do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, explica a persistência de situações como falta de concentração, incapacidade de sentir prazer em atividades que gostamos e na convivência com pessoas são indícios claros da doença e alerta de que é preciso buscar ajuda médica.

Quanto antes se inicia um tratamento contra a depressão, mais chances o paciente tem de melhorar. E o contrário também vale: a demora pode agravar a doença e tornar a recuperação mais difícil.

Conforme dados deste ano da Organização Mundial da Saúde (OMS) o mundo tem 320 milhões de pessoas diagnosticadas com depressão. A cada 100, 15 chegam à decisão de cometer suicídio.

A OMS também afirma que, se diagnosticada e tratada nos estágios iniciais do transtorno, 60% a 80% dos casos de depressão são controlados e, até, resolvidos.

De acordo com o Instituto de Psiquiatria Paulista, os principais sintomas de depressão são:

  • Humor deprimido
  • Humor ansioso ou irritável
  • Perda de interesse e prazer
  • Perturbações do sono
  • Sentimento de culpa excessiva
  • Dificuldade de concentração
  • Perda de energia
  • Pensamentos suicidas
  • Alterações na libido
  • Alterações na apetite

“Seja por dificuldade em reconhecer este estado emocional ou pela existência de estigma em relação à depressão e outros transtornos mentais, é frequente que pessoas sofrendo com depressão demorem para buscar ajuda”, diz o médico.

“Colocar-se disponível para escutar e acolher o sofrimento de quem está deprimido, compartilhar experiências próprias sobre acompanhamento com profissionais de saúde mental e indicar profissionais de confiança podem facilitar este processo de busca de ajuda.”

O Especialista – Quais são sinais de um início de depressão em pessoas adultas, sem ocorrências anteriores?
Daniel Costa – Os sintomas mais característicos da depressão incluem a tristeza persistente e a dificuldade de experimentar prazer em atividades que antes eram fonte de satisfação. Além destes, pode haver uma série de outros sinais e sintomas, como dificuldade de concentração, diminuição ou aumento do peso/apetite, insônia ou sonolência excessiva, cansaço, sentimentos de inutilidade, desesperança em relação ao futuro, falta de energia e lentidão tanto do pensamento quanto das ações. Em casos mais graves, pessoas com depressão sentem que a vida não tem sentido, não vale a pena continuar vivendo e até mesmo ter pensamentos ou tentativas de suicídio. Do ponto de vista médico, este diagnóstico deve ser considerado se os sintomas estiverem presentes na maior parte do dia e na maioria dos dias ao longo de, no mínimo, 2 semanas. Além disso, os sintomas devem estar associados a prejuízos no rendimento acadêmico ou profissional ou na relação com pessoas próximas.

Que pistas nos dão as crianças e adolescentes?
Sentir-se triste ou desesperançoso faz parte da vida de qualquer criança ou adolescentes. Mas se estas queixas forem persistentes e acompanhadas de desinteresse por atividades que a criança costumava gostar, podemos suspeitar de depressão. Alguns sinais a que os pais ou familiares próximos devem estar atentos incluem:

  • sentimento de tristeza, desesperança ou irritabilidade na maioria dos dias
  • recusa ou perda da capacidade de experimentar prazer/alegria em brincadeiras ou contato com outras crianças
  • mudança do padrão alimentar: aumento ou redução do apetite
  • mudança no padrão de sono
  • mudança no nível de energia: algumas crianças podem se mostrar mais cansadas ou “preguiçosas”, tensas ou com dificuldade para relaxar
  • dificuldade de manter a atenção nas atividades escolares
  • sentimentos de incapacidade, inutilidade ou culp
  • comportamentos de auto-mutilação ou agressividade

Na família, no trabalho ou na comunidade, em que momento se deve abordar alguém que esteja sinalizando um quadro depressivo sem perceber?
Quanto mais cedo uma pessoa com depressão receber cuidados profissionais, maiores são suas chances de recuperação e menor o impacto na sua qualidade de vida. Seja por dificuldade em reconhecer este estado emocional ou pela existência de estigma em relação à depressão e outros transtornos mentais, é frequente que pessoas sofrendo com depressão demorem para buscar ajuda. Colocar-se disponível para escutar e acolher o sofrimento de quem está deprimido, compartilhar experiências próprias sobre acompanhamento com profissionais de saúde mental e indicar profissionais de confiança podem facilitar este processo de busca de ajuda.

E em nós mesmos: como notar que um mal-estar prolongado pode estar se transformando (ou se estabelecendo) como depressão?
Acredito que o principal sinal de que é hora de buscar ajuda seja a sensação de que os nossos mecanismos de auto-regulação e resiliência, que antes funcionavam bem para lidar com emoções negativas passageiras, não estão mais sendo suficientes para lidar com o sofrimento provocado por estados depressivos.

É possível explicar a depressão em etapas diferentes?
Sim, em geral, classificamos a intensidade da depressão em leve, moderada ou grave. Nos casos mais graves, observamos a presença de comportamento suicida ou sintomas psicóticos, como delírios de ruína (por exemplo, ter certeza de que não há solução para os seus problemas ou até mesmo achar que está morto ou com uma doença grave).

A depressão pode ser confundida com outros distúrbios? Se sim, com quais isso ocorre de forma mais recorrente?
Sim, existem diversas condições médicas e psiquiátricas que podem ser confundidas com a depressão. Doenças como hipotireoidismo e anemia devem ser descartadas antes de batermos o martelo que a manifestação seja de natureza exclusivamente psiquiátrica.
Além disso, uma anamnese psiquiátrica detalhada permite diferenciar se as queixas são melhor explicadas por um transtorno psiquiátrico diferente de depressão. Isolamento social, por exemplo, pode ser uma manifestação tanto da depressão quanto da fobia social. Na primeira, o isolamento é uma consequência do desinteresse ou dificuldade de experimentar prazer nas relações com outras pessoas. Na 2a, decorre do desconforto sentido durante a interação com outras pessoas e do medo de ser julgado/mal avaliado por elas. Enfim, uma escuta cuidadosa e a investigação ativa de algumas queixas permitem que essa diferenciação seja feita com alguma facilidade.

Sabemos que o acompanhamento psicoterapêutico é indicado em todos os casos. Mas existem novos tratamentos, medicações mais modernas com menos efeitos colaterais, prescrições que possam ser temporárias? Como saber se um tratamento está de fato atuando contra um quadro de depressão?
Sim, existem alguns tratamentos desenvolvidos mais recentemente que apresentam ganhos em relação a medicamentos mais antigos. Estes ganhos incluem menor incidência de efeitos colaterais desagradáveis (como por exemplo alteração do apetite/peso e libido) e menor tempo para que sejam observados os efeitos terapêuticos do tratamento.
Para quem busca ajuda pela 1a vez para tratar a depressão, a regra é que este tratamento se estenda por 9-12 meses. Na maioria das vezes, o relato subjetivo do paciente é suficiente para monitorarmos a eficácia do tratamento. Alem disso, tem ganhado força ultimamente a utilização de questionários auto-respondidos que permitem mensurar de forma confiável a gravidade dos sintomas depressivos, o que pode ser útil para monitorar a efetividade do tratamento.

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