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El Niño: fenômeno climático afeta início da safra de alimentos no Brasil

Relatório da FAO aponta perdas de US$ 3,8 trilhões na produção agrícola global em 30 anos com desastres do clima; El Niño afeta safra brasileira

Colheita de milho

Depois de quase três anos sob as condições do fenômeno La Niña, que duraram até março, o panorama climático mudou | Foto: Getty Images

O fenômeno climático El Niño deve continuar afetando a safra agrícola brasileira no início da próxima Safra, segundo relatório da FAO, que prevê impacto na inflação dos produtos agrícolas nos próximos meses.

Em anos em que ocorre o El Niño, o Brasil registra aumento da disponibilidade hídrica no centro-sul, o que tende a beneficiar as culturas de grãos, como a soja e o milho na primeira safra. No entanto, o excesso de chuva na Região Sul pode aumentar a umidade e a severidade de doenças em plantas, exigindo maior vigilância e cuidados no monitoramento e manejo das culturas. Já em áreas do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, a redução das chuvas pode resultar em perdas significativas de produtividade. No Brasil Central, a irregularidade da chuva também dificulta o manejo agrícola e afeta a produtividade.

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O El Niño Oscilação Sul (ENOS) que ocorre atualmente é caracterizado pela interação entre a atmosfera e o oceano, no Pacífico Equatorial. A fase quente do fenômeno provoca aquecimento anormal das águas do Oceano Pacífico, e a La Niña (fase fria), causa resfriamento dessas águas. Ambas as fases têm o potencial de influenciar significativamente os padrões climáticos globais.

Depois de quase três anos sob as condições do fenômeno La Niña, que perduraram até março deste ano, o panorama climático mudou. As águas do Pacífico Equatorial se aqueceram rapidamente nos meses subsequentes, e, em junho, foi oficialmente confirmado o início das condições do El Niño.

Desde então, a intensidade tem variado de fraca a moderada, com anomalias da Temperatura da Superfície do Mar (TSM) oscilando entre 0,9°C e 1,3°C até o mês de agosto. No entanto, em setembro/outubro, as anomalias apresentaram valores em torno de 1,5°C, indicando uma possível evolução para uma classificação mais intensa do fenômeno. Contudo, para consolidar essa classificação, é essencial que as temperaturas se sustentem nesse patamar elevado nos próximos meses.

Relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura sobre perdas com o clima

Relatório da FAO aponta perda s de US$ 3,8 trilhões em 30 anos com fenômenos climáticos

“Estima-se que as produções agrícola e pecuária em todo o mundo tenham sofrido perdas de US$ 3,8 trilhões devido a desastres nos últimos 30 anos. Esse total equivale a uma perda média de US$ 123 bilhões por ano, ou 5% do produto interno bruto agrícola global anual. O resultado faz parte do novo relatório divulgado hoje pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

Intitulado “O Impacto dos Desastres na Agricultura e na Segurança Alimentar”, o novo relatório apresenta a primeira estimativa global sobre o impacto dos desastres na produção agrícola, com foco nas colheitas e na pecuária. O documento também ressalta que o número poderia ser maior se houvesse mais disponibilidade de dados sistemáticos sobre perdas nos subsetores de pesca, aquicultura e silvicultura. O relatório enfatiza a necessidade de melhorar urgentemente a coleta de informações sobre o impacto dos desastres em todos os subsetores agrícolas, a fim de criar sistemas de dados que possam servir de base para ações eficazes.

“A agricultura é um dos setores mais expostos e vulneráveis no contexto do risco de desastres, dada a sua alta dependência de recursos naturais e das condições climáticas. Os desastres frequentes podem prejudicar os ganhos de segurança alimentar e minar a sustentabilidade dos sistemas agroalimentares”, disse o diretor-geral da FAO, QU Dongyu, no prefácio do relatório. “Com base na experiência técnica da FAO, a publicação apresenta opções para abordar proativamente os riscos existentes na agricultura e mostra maneiras de integrar o risco de desastres às práticas e políticas agrícolas.

O relatório revela que, nas últimas três décadas, as catástrofes – definidas como graves interrupções no funcionamento de uma comunidade ou sociedade – provocaram as maiores perdas relativas nos países de renda baixa e média-baixa, responsáveis por 15% do PIB agrícola total. Os desastres também tiveram um impacto significativo nos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS), que perderam quase 7% de seu PIB agrícola.

Perdas por grupo de commodities

O relatório também indica que as perdas das principais commodities agrícolas estão apresentando tendências de alta. Nas últimas três décadas, as perdas de cereais atingiram, em média, 69 milhões de toneladas por ano – o que corresponde à produção total de cereais na França em 2021 – seguidas pelas perdas de frutas, legumes e nas culturas de açúcar, cada uma com uma média de 40 milhões de toneladas por ano. No caso das frutas e das hortaliças, as perdas equivalem à produção total dessas commodities no Japão e no Vietnã no ano de 2021.

Carnes, laticínios e ovos apresentaram uma perda média estimada em 16 milhões de toneladas ao ano, o que corresponde à produção total desses produtos no México e na Índia em 2021.

Diferenças regionais

As perdas globais ocultam uma considerável discrepância entre as diferentes regiões, sub-regiões e os grupos de países. De acordo com o relatório, a Ásia respondeu pela maior parte do total de perdas econômicas. A África, a Europa e as Américas também apresentaram uma ordem de grandeza semelhante. No entanto, as perdas na Ásia foram responsáveis por apenas 4% do valor agregado agrícola, enquanto na África corresponderam a quase 8%. A variação foi ainda maior entre as sub-regiões.

Em termos absolutos, as perdas foram maiores nos países de alta renda, nos países de renda média-baixa e nos países de renda média-alta, embora os países de baixa renda, e especialmente os SIDS, tenham registrado a maior ocorrência de perdas de valor agregado agrícola.

Efeitos em cascata

O número de catástrofes aumentou de 100 por ano na década de 1970 para cerca de 400 por ano em todo o mundo nos últimos 20 anos. Além de aumentarem em frequência, intensidade e complexidade, espera-se que seus impactos sejam cada vez piores, pois os desastres causados pelas mudanças climáticas agravam as vulnerabilidades sociais e ecológicas.

O relatório destaca que, quando ocorrem ameaças, elas podem ter efeitos em cascata em vários sistemas e setores. Entre os fatores subjacentes ao risco de desastres estão as mudanças climáticas, a pobreza e a desigualdade, o crescimento populacional, as emergências sanitárias causadas por pandemias, práticas como o uso e a gestão insustentáveis da terra, conflitos armados e degradação ambiental.

A magnitude das perdas e dos danos causados por um desastre depende da velocidade e da escala espacial em que um perigo interage com vulnerabilidades e riscos preexistentes, juntamente com o valor dos ativos ou meios de subsistência expostos.

Em casos extremos, os desastres levam ao deslocamento e à emigração das populações rurais. As graves inundações causadas por chuvas de monções anormais na província de Sindh, no sul do Paquistão, são um exemplo ilustrativo de como a combinação de perigos repentinos e de início lento levou a esses deslocamentos, afetando negativamente os sistemas agroalimentares e aumentando a insegurança alimentar.

Rumo a uma maior resiliência dos sistemas agroalimentares

Os agricultores, especialmente os pequenos produtores que trabalham em condições de sequeiro, são as partes interessadas mais vulneráveis nos sistemas agroalimentares e, portanto, geralmente sofrem o maior impacto dos desastres. O apoio à adoção de boas práticas de redução do risco de catástrofes no campo pode ajudar os pequenos agricultores a evitar perdas e aumentar sua resiliência. Investir em boas práticas de redução de risco de desastres nas zonas rurais pode ter um retorno médio 2,2 vezes maior do que as práticas aplicadas anteriormente.

Intervenções proativas e oportunas em resposta a ameaças previstas são essenciais para promover a resiliência por meio da prevenção e da redução dos riscos na agricultura. Por exemplo, as medidas preventivas em vários países revelaram relações favoráveis de custo-benefício entre investimentos em prevenção de desastres e construção de resiliência. O relatório constatou que, para cada dólar investido em medidas preventivas, as famílias rurais podem obter até US$ 7 em benefícios e evitar perdas agrícolas. (Com AE e FAO)

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