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Quadro fiscal piora e resultado depende de medidas ainda não aprovadas

Resultado primário de 2024 está fortemente relacionado aos efeitos de medidas de arrecadação ainda pendentes de aprovação

Resultado fiscal

Resultado primário de 2024 está fortemente relacionado aos efeitos de medidas de arrecadação ainda pendentes de aprovação | Foto: Getty Images

O projeto de lei orçamentária anual de 2024 (PLOA 2024) foi elaborado em consonância com o novo arcabouço fiscal (LC 200/2023), propondo a desafiadora meta de resultado primário zero. O primário equilibrado seria decorrente de receita primária total de 23,7% do PIB, que após transferências a estados e municípios, resultaria em receita líquida de 19,2% do PIB, menos despesa primária em montante ligeiramente abaixo desse valor, resultando em pequeno superávit primário de R$ 2,8 bi (0,0% do PIB).

Importante destacar que a previsão de receitas totais de 23,7% do PIB embute a expectativa de aprovação de um pacote de medidas legislativas que soma 1,5% do PIB (R$ 168,5 bilhões),
sendo que parte desse valor é dividido com os entes subnacionais.

As projeções fiscais para o ano de 2024 estão, dessa forma, fundamentalmente condicionadas ao sucesso do pacote de medidas de arrecadação. Na ausência dessas medidas, a receita líquida do governo central seria próxima de 17,7% do PIB, montante similar ao projetado pelo governo para o ano corrente, em 17,9% do PIB. Já as despesas previstas para 2024 estão no mesmo patamar do previsto para 2023, de 19,2% do PIB.

Assim, a melhora do resultado fiscal no ano que vem em relação à projeção do governo para este ano está dependente daquelas medidas.

O cenário básico do banco Safra prevê resultado primário de -0,6% do PIB em 2024 (Gráfico 1). Trata-se de ligeira piora frente à projeção anterior de -0,5% do PIB (ver Safra Semanal de 15/09/2023), incluindo a revisão baixista do resultado fiscal de 2023 (para -1,2% do PIB, de -0,9% do PIB anteriormente).

A projeção conta com a expectativa de um crescimento real do PIB de 2,5% no ano que vem e sucesso parcial das medidas de receitas a serem aprovadas no Congresso, que totalizariam R$ 102 bilhões brutos (R$ 66,0 bilhões líquidos para a União). Além disso, o Safra incorporou na projeção a reoneração integral do diesel (R$ 18,6 bi ou 0,16% do PIB) – a reoneração da gasolina e etanol já estava nos números – e a desoneração da folha municipal (R$ 7,5 bi ou 0,07% do PIB).

O noticiário indica a possibilidade de que a desoneração municipal, se aprovada pelo Senado, seja vetada pelo Presidente, daí ser um risco positivo no cenário (detalhes a seguir).

Além das medidas legislativas pendentes de aprovação, o PLOA incorporou em suas projeções outras duas fontes relevantes de receitas, que juntas somam R$ 102 bilhões (0,9% do PIB). A primeira envolve R$ 44,4 bilhões de receitas “não administradas”, atribuídas a concessões e permissões. Trata-se de um valor superior à média histórica (R$ 21 bi entre 1997 e 2022, a preços atuais), sendo a maior parte referente a concessões de transportes (R$ 41,6 bi), principalmente em ferrovias (R$ 34 bilhões), dada a expectativa de revisão da extensão de contratos efetuados em anos recentes.

As projeções do Safra atribuem R$ 19,4 bilhões de receitas de concessões e permissões, sob a premissa principal de que 40% do valor previsto para transportes se concretize, além de quase R$ 3 bi de outras concessões.

A segunda fonte importante de receitas prevista no PLOA são R$ 58 bilhões da exclusão do ICMS da base de cálculo dos créditos do PIS/Cofins (Lei 14.592/23). Essa legislação foi aprovada no final de maio deste ano e, segundo notícias veiculadas na imprensa, tem havido muita disputa entre o fisco e contribuintes a respeito da sua aplicação, em muitos casos levando à suspensão da cobrança por decisões liminares nas primeiras e segundas instâncias da Justiça, sinalizando que os casos poderiam seguir para o STF.

De fato, até o momento, os relatórios mensais de arrecadação federal não mencionam a entrada de receitas decorrentes dessa legislação, indicando a possibilidade de menor receita nessa linha no ano que vem. Por isso, conservadoramente, o Safra não está considerando qualquer valor desse tema nas projeções.

Há riscos altistas e baixistas em torno da projeção central de déficit primário de 0,6% do PIB (Quadro 1). As diferentes hipóteses à respeito dos efeitos das medidas, bem como a incorporação de outros riscos fiscais, levam a cenários bastante distintos para o resultado primário, variando de -1,2% do PIB (pior cenário) a 0,0% do PIB (melhor cenário).

Ou seja, somente no cenário 6 (melhor cenário), em que apenas os riscos positivos são considerados, é que se pode vislumbrar o cumprimento da meta de resultado primário zero. Abaixo estão algumas simulações alternativas do Safra para o resultado primário do próximo ano.

Um outro importante fator a afetar o resultado primário, que não pode ser exatamente considerado como risco, são os eventuais contingenciamentos de despesas a serem executados ao longo do ano. Uma possível frustração de receitas e, consequentemente, o risco ao cumprimento da meta de primário zero, poderá levar o governo a contingenciar despesas nos primeiros meses do ano, inclusive investimentos.

Pela nova regra fiscal instituída pela LC 200/2023, “…o nível mínimo de despesas discricionárias necessárias ao funcionamento regular da administração pública é de 75% do valor autorizado na respectiva lei orçamentária anual”(art.7o, parágrafo 2o). Ou seja, o contingenciamento máximo a ser aplicado sobre os gastos discricionários previstos na PLOA seria 25% do valor ali presente (R$ 174,3 bilhões), o que resultaria num corte de até R$ 43,6 bi (0,4% do PIB).

Assim, um eventual contingenciamento dessa magnitude reduziria o déficit fiscal esperado para o próximo ano. A sinalização inicial do governo de manter o nível de gastos próximos a 19,2% do PIB sugere dificuldade em realizar um contingenciamento volumoso.

Resultado fiscal depende de aprovação de medidas no Congresso

Em suma, o resultado primário de 2024 está fortemente relacionado aos efeitos de medidas de arrecadação ainda pendentes de aprovação. Nossa projeção de déficit primário de 0,6% do PIB se mostra viável, mas existem riscos em ambas direções.

Um contraponto positivo ao cenário desafiador de receitas e despesas primárias e que merece uma palavra final diz respeito à dívida pública. O Banco Safra revisou a projeção de dívida bruta de 2023 para 75,7% do PIB (ante 76,9% do PIB anteriormente) e 2024 para 77,8% do PIB (de 78,8% do PIB).

A principal razão é que o Tesouro Nacional tem feito emissões líquidas negativas, isto é, vem emitindo títulos públicos em volume inferior aos resgates (principalmente vencimentos). Assim, no lugar de rolar a dívida por meio da emissão de novos títulos, o Tesouro vêm cobrindo parte de suas necessidades de financiamento (dada basicamente pela soma de vencimento de títulos mais déficits primários) via saques de sua Conta Única no Banco Central.

Com isso, o estoque da dívida é reduzido, mas sob pena de redução da reserva de liquidez. Até agosto, esse “colchão” foi reduzido em R$ 151,3 bi frente ao estoque de 2022. Mesmo assim, ele ainda cobre 7,9 meses de vencimentos. Trata-se de uma cobertura razoável, abaixo da média histórica (9,7 meses entre jan/16 e ago/23), mas acima dos pisos mínimos considerados críticos (entre 6 a 7 meses).

Íntegra da análise do Safra sobre o cenário macroeconômico.

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