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Piora fiscal exige disciplina para garantir queda dos juros e crescimento

Disciplina fiscal precisa ser rigorosa para evitar escorregada que afete o desempenho econômico potencial ou os juros, avalia o Banco Safra

Riscos fiscais

Piora nas projeções do governo revela que maior fonte de pressão não tem vindo de queda das receitas, mas principalmente do aumento de gastos | Foto: Getty Images

O relatório de avaliação de receitas e despesas do governo central relativas ao 5º bimestre apontou considerável piora fiscal, com deterioração do resultado primário para 2023. O déficit primário projetado pelo governo aumentou de R$ 141 bilhões (-1,3% do PIB) para R$ 177 bilhões (-1,7% do PIB). Essa piora foi motivada por uma queda de R$ 14 bi na receita líquida e alta de R$ 21,8 bi em despesas.

O tamanho da revisão em um único bimestre assusta, ainda que parte seja devida a antecipações que não prejudicam de forma significativa as projeções para 2024. Do lado das receitas, deixou-se de contar com a entrada de R$ 12,6 bi de depósitos judiciais da Caixa Econômica, o que pode se traduzir em alguma entrada adicional em 2024. Além disso, houve revisão para baixo de R$ 9,0 bilhões brutos na arrecadação tributária, principalmente pela revisão baixista de índices de inflação, o que acaba por reduzir as receitas em termos nominais. Neste caso, a base mais fraca de receitas em 2023 traz risco baixista para o nível de receitas em 2024, segundo avaliação do Banco Safra.

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Do lado das despesas, ainda se lida com os efeitos de medidas de meados de 2022. Houve aumento de R$ 16,3 bi na previsão de compensações para estados e municípios, após aprovação final da LC 201/2023. O Safra já havia incorporado os efeitos dessa lei em revisão recente, mas o número revelado no relatório do 5º bimestre foi R$ 6 bilhões acima do estimado.

Como essas compensações incorporam a antecipação, de 2024 para 2023, de perdas de ICMS, então o gasto maior esse ano significa um gasto menor no ano que vem, ao menos do ponto de vista do governo central.

Do ponto de vista dos estados e municípios, as receitas maiores esse ano e o pouco tempo para que estas sejam transformadas em gastos aumenta as chances de que as despesas subnacionais subam mais ano que vem, em parte neutralizando a potencial melhora do primário no governo central. Assim, no líquido, o efeito para o resultado primário do setor público consolidado do ano que vem tende a ser neutro.

O relatório também aumentou a previsão de despesas mínimas em Saúde em R$ 4,3 bilhões. O Safra não havia computado esse valor nas projeções. É possível, porém, que essa pequena alta na dotação orçamentária da Saúde não se materialize em efetivo pagamento este ano, não afetando assim o resultado primário.

Em primeiro lugar, conforme veiculado na imprensa essa semana, mais precisamente no dia de divulgação do relatório do 5º bimestre, o TCU (Tribunal de Contas da União) entendeu que os pisos mínimos constitucionais para as áreas de saúde e educação, que voltaram a ser vinculados como percentuais da receita com o fim do antigo teto dos gastos, só devem ser observados a partir de 2024.

Além disso, o relatório bimestral continua prevendo o pleno dispêndio de dotações que por ora apresentam pouca probabilidade de execução (representando recursos “empoçados”), sendo que o maior volume desses recursos está na Saúde.

Essa é uma das razões pelas quais as projeções oficiais continuam apresentado um déficit primário maior do que aquele projetado pelo Safra.

Piora fiscal: mudanças nas projeções do Tesouro ao longo do ano

As pioras nas projeções fiscais nos relatórios bimestrais ao longo de 2023 deveram-se mais a aumentos de despesa do que a quedas de receitas (Gráficos abaixo).

Enquanto a receita líquida caiu R$ 15 bi do primeiro ao quinto relatório, a despesa primária total subiu R$ 55 bilhões. A pouca queda da receita reflete um nível de atividade econômica que surpreendeu para cima e que em alguns casos validaram projeções otimistas do governo (como o PIB de 3,0%).

Também não houve grandes variações nas projeções de inflação, com as estimativas de IPCA e IGP-DI oscilando ao redor de 4,7% e -3,0%, respectivamente, ou da massa salarial (perto de 10%).

Mesmo o preço do barril do Brent fugiu apenas brevemente da faixa dos US$ 85, com variações pequenas de US$ 5 para mais e para menos. A maior queda da receita deveu-se assim a fatores
não econômicos, como por exemplo o Tesouro deixar de prever a entrada dos depósitos compulsórios na Caixa, provavelmente por motivos administrativos ou contábeis.

As despesas vêm crescendo ao longo dos bimestres. Entre os cinco grandes grupos de despesa divulgados pelo Tesouro Nacional (Gráfico 7), destaca-se a alta naquelas da Previdência e, em menor grau, em “outras obrigatórias”.

As projeções da despesa com pessoal, por outro lado, mantiveram-se relativamente estáveis. Entre os principais itens de “outras despesas obrigatórias”, há alguma variedade nas dinâmicas de
despesas.

As reavaliações do abono salarial e das transferências do BPC/LOAS tiveram moderado aumento ao longo do ano. Por outro lado, aquela com precatórios teve pequena queda (Gráfico 8).

Já o maior aumento se deu por causa de uma despesa que se tornou obrigatória, mas que não será recorrente, que é aquela associada à compensação dos estados pelas perdas decorrentes do corte dos impostos sobre combustíveis antes da eleição de 2022.

A projeção do montante dessa linha de gasto cresceu perto de R$ 20 bilhões, o que junto a outros apoios (Lei Aldir Blanc e Lei Paulo Gustavo) levou a projeção do custo de apoios aos entes subnacionais a subir em R$ 25 bilhões no ano.

Em resumo, a surpresa da deterioração do resultado primário revelada no relatório do 5º bimestre reflete principalmente fatores pontuais que não devem prejudicar o resultado fiscal de 2024, avalia o Banco Safra.

Destaca-se também que a piora nas projeções do governo observada ao longo do ano revela que a maior fonte de pressão não tem vindo de queda das receitas, mas principalmente do aumento de gastos, alguns de natureza recorrente, como aqueles previdenciários e assistenciais, e outros não, como a compensação aos entes subnacionais das perdas com a redução dos impostos sobre energia imposta antes da eleição de 2022.

“Assim, a disciplina fiscal precisará ser cada vez mais rigorosa para evitar uma escorregada que afete o desempenho econômico potencial ou os juros”, avalia o Safra.

Íntegra do relatório macroeconômico semanal do banco Safra.

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